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A Magia do Cinema

É preciso concordar com quem critica a sociedade moderna. A correria do dia-a-dia, o excesso de tecnologia, as facilidades que apenas dificultam e outras decorrências do mundo atual têm acabado ou encolhido valores e experiências que antes faziam toda a diferença. Coisas como um jantar em família e o apreço por um bom livro parecem cada vez mais raras.

Essa perda da magia de determinados aspectos da vida estende-se ao cinema. Houve uma época em que ir às salas era um grande evento. A família toda se reunia, as pessoas vibravam com o que passava na tela por aproximadamente duas horas e voltavam para casa com a certeza de ter feito algo muito maior e mais importante do que apenas assistir a um filme.

Hoje isto parece ter se perdido em algum lugar pelo caminho. Está difícil encontrar pessoas que sentem prazer verdadeiro em entrar numa sala de cinema. Tirando os cinéfilos e alguns poucos outros, ir ao cinema nada mais é do que um programa qualquer, uma desculpa para namorar ou um passatempo como fazer palavras cruzadas e dar uma caminhada no parque.

E a realidade é que não se pode culpar o grande público por isso. Com o verdadeiro leque de opções para se assistir uma obra no conforto de casa, por que razão alguém em sã consciência se deslocaria até uma sala cheia de gente? Por que assistir a um lançamento badalado na companhia de adolescentes histéricos e comedores de pipoca se é possível conseguir o mesmo filme com apenas um clique do mouse? Por que pagar exorbitantes R$ 13,00 se pode-se assistir a qualquer filme de graça?

Dentro deste contexto, é até compreensível que determinadas pessoas abandonem o ritual de ir ao cinema. O reino da fantasia erigido pela gigantesca tela tornou-se não mais um momento aguardado, mas um sacrifício. E o que é pior, com toda a pirataria por aí, um sacrifício desnecessário.

A questão, porém, é que o filme em si e a ida a uma sala são duas coisas diferentes. Claro que uma produção pode ser assistida em casa. Pode ser assistida num avião, num celular ou em diversos outros lugares. No entanto, nem todos estes acessos somados se comparam à experiência de apreciar uma obra no cinema.

Já fui ao cinema milhares de vezes e sempre que aquelas luzes se apagam sou tomado por uma certa emoção. Aliás, este é um dos motivos pelo qual gosto de chegar cedo nas sessões. A transição da sala do claro para o escuro faz parte do ritual. O enfraquecimento das lâmpadas é o momento decisivo, é um sinal. É um aviso: “Esqueça tudo o que existe lá fora. Dê sua mão aos diretores, aos atores, aos roteiristas e prepare-se para ser levado a outro mundo”. Ir ao cinema é quase participar de uma experiência extra-corporal, onde é possível quase esquecer-se de si mesmo.

E é o que acontece. Por pior que seja o filme, ir ao cinema sempre é uma experiência reconfortante e recompensadora. Há uma mística envolvendo aquela tela, aquelas poltronas e aquela escuridão que conseguem, inclusive, superar a qualidade da obra em questão. Arrisco-me a dizer que pode ser até melhor ver um filme médio no cinema do que uma grande obra em casa.

Por tudo isso, sinto-me desolado quando vejo o número de freqüentadores do cinema cair vertiginosamente. Acredito que a arrecadação das bilheterias em 2006 tenha sido uma das menores dos últimos. E também acredito que isso tenha mais a ver com tudo o que citei aqui do que com a qualidade dos filmes (Piratas do Caribe 2, o filme mais lucrativo do ano, não passava de uma aventura competente).

E, sinceramente, não vejo solução. O sentimento que antes uma ida ao cinema despertava parece ter evaporado. Como resolver este problema eu não sei. O que sei é que não será a pirataria, a internet ou os preços altos que me deixarão longe da maior disseminadora de sonhos que o homem já criou. Pelo menos pra mim, a magia continua.

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