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Críticas

Cineplayers

A obra-prima máxima de Terry Gilliam foi um filme à frente de seu tempo, que ainda hoje fascina.

9,0

Terry Gilliam é um diretor complexo. Ou melhor: Terry Gilliam é um diretor de filmes complexos. Mas não só de filmes complexos também. É dele o filme considerado a melhor comédia de todos os tempos por muitas pessoas e críticos: Monty Python em Busca do Cálice Sagrado, talvez o filme do gênero que mais inspirou outros diretores em todos os tempos. Monty Python não é um filme complexo, mas mesmo assim é um filme altamente diferenciado. O diretor também fez o estranhíssimo (e também complexo) Os 12 Macacos, e seu filme mais recente é o esquisitão Medo e Delírio, uma viagem alucinante (ou seria alucinógena?) ao mundo das drogas.

Para este ano, Gilliam já está pré-produzindo (e vai dirigir) Good Omens. Se não ocorrer nenhum imprevisto, o filme deve chegar lá pelo final do ano nos Estados Unidos. Dificilmente vai conseguir, produções desse tipo geralmente são complexas (ops, de novo!). Good Omens é – adivinhem só! – outro filme com uma premissa bizarra: é uma fantasia sobre o Armageddon, com o anti-cristo chegando ao planeta na forma de um bebê. Vai dar o que falar... Bem, esse foi um resumo totalmente supérfluo da carreira de diretor de Terry Gilliam, mas é necessário para as pessoas entenderem o que estarão esperando caso resolvam aventurar-se no filme que é considerado a sua obra-prima até o momento: Brazil - O Filme!

Do nosso país, nosso querido Brasil, o filme tem muito pouco. Apenas a trilha sonora tem relação com ele. Pra ser mais exato, a música-tema do filme é a Aquarela do Brasil, clássico composto por Ary Barroso. De resto, não há nenhuma outra referência a nosso país. A história – uma ficção científica futurista e bastante fantasiosa – é sobre uma sociedade estranhíssima (assim como em 12 Macacos), depressiva, infeliz, altamente alienada por burocracia. Em Brazil, o mundo criado por Gilliam é ainda mais importante que seus personagens, embora estes sejam muito interessantes.

O clima do filme é escuro, depressivo, tedioso. O mundo é um completo caos. Se você acha as grandes metrópoles do início do novo milênio caóticas, espere para conhecer o mundo retratado em Brazil. Gilliam teve a felicidade de, mesmo criando um mundo futurista fantasioso, já em 1984, quando produziu o filme, prever vários aspectos que hoje são comuns à nossa sociedade (mesma coisa que Kubrick fez em Laranja Mecânica), como o individualismo do homem, e até mesmo a convivência diária com vários atentados terroristas.

Sim, os atentados são o grande problema do momento da sociedade de Brazil, e Sam Lowry, nosso protagonista (finalmente chegamos nele), que acabara de receber uma promoção para um departamento mais importante no governo, onde cuida da burocracia (ele e seus companheiros de trabalho devem lidar com milhares de papéis, num ambiente intoxicante), acaba se envolvendo com a mulher de seus sonhos, que é uma terrorista (ou no mínimo parece uma). Durante boa parte do filme, Gilliam exibe cenas absolutamente bizarras de Sam sonhando com essa mulher, perseguindo-a pelos céus com um grande par de asas, porém sempre sendo impedido pelos seus comandantes (simbolizado pelo grande samurai), que querem dele apenas trabalho, trabalho, e mais trabalho. Como em outros filmes de Gilliam (e como em filmes de David Lynch também) as cenas “estranhas” podem ser interpretadas de várias maneiras, esta apresentada é apenas uma delas.

Mas ainda tem mais história pra contar: enquanto trabalha e continua tendo seus sonhos esquisitos com a tal mulher, um funcionário acaba, acidentalmente, cometendo um erro de cadastro. O fugitivo da polícia Tuttle acaba tendo seu nome trocado para Buttle por causa de tal acidente, e Buttle, cidadão pacato e inocente, acaba sendo preso no lugar de Tuttle. Tuttle é interpretado por Robert De Niro, em um papel estranhíssimo. Ele e Sam acabam se encontrando várias vezes em situações bastantes esquisitas (pra variar).

Criar uma sinopse para Brazil é dos trabalhos mais difíceis que existem. O filme é tão “diferente”, com sua história tendo tantos detalhes anormais, que fica difícil entendê-la sem ver o filme (bem, mesmo vendo ele não é a coisa mais fácil de de entender). O filme ainda conta com uma galeria grande de personagens interessantes, como a mãe de Sam, que está com o rosto incrivelmente esticado de tanto fazer cirurgias plásticas; e o Sr. Kurtzmann, interpretado por Ian Holm (o Bilbo de O Senhor dos Anéis – a trilogia), que não quer perder o seu eficiente funcionário Sam para outro departamento.

De não tão fácil assimilação, o principal que fica depois de se assistir Brazil – O Filme, é a mensagem que Gilliam nos passa, de um futuro, mesmo que fantasioso no filme, possível em vários pontos (alguns deles já existentes, como já foi citado). Não há muito o que uma pessoa, sozinha, possa fazer para evitar que mais aspectos negativos do filme se tornem realidade, mesmo assim, vale a pena fazer a sua parte. Espero apenas que no mundo real, no futuro, não haja tamanha burocracia e a alienação com papéis vistas em Brazil. Difícil, já que uma coisa Gilliam não previu: o crescimento da importância dos computadores, que eliminam quase toda a papelada.

Brazil – O Filme é uma obra-prima difícil de assistir, difícil de digerir. Não é um filme para quem busca entretenimento. Infelizmente, 99% das pessoas que dizem gostar de cinema acabarão nunca assistindo a este filme. Uma pena, mas fica aqui a recomendação valiosa. A versão analisada aqui é a versão do diretor, que foi lançada tempos depois da original com 11 minutos de cenas a mais, entre elas alguns momentos mais “quentes” entre Sam e sua amada. Assim como os filmes de Terry Gilliam, analisar Brazil é tão complexo que tenho certeza que você não entendeu praticamente nada, assim como dificilmente entendi o que escrevi... Então estamos quites.

Comentários (5)

Renata Correia Nunes | terça-feira, 28 de Maio de 2013 - 22:09

Apesar de ser um pouco longo e arrastado em algumas partes, esse filme é maravilhoso! Obra-prima!

Silvia Lima | terça-feira, 03 de Setembro de 2013 - 22:52

Eu gosto demais deste filme. Vi incontáveis vezes e sempre foi um prazer para mim. Brazil é um filme incomum, é muito sofisticado, mas quem conhece Terry.. não se surpreenderá, já que essa é sua marca registrada, e quem ainda não o conhece poderá ficar extasiado. Brazil tem um força descomunal. Revira todas as gavetas, onde não se encontram nem otimismo nem saídas de emergência, mas faz isso com dois elixires fundamentais na arte de tornar a vida neste mundo um pouco mais suportável: Amor e humor.

Cristian Oliveira Bruno | sábado, 23 de Novembro de 2013 - 14:23

Que é sim uma obra-prima, ninguém discute, mas ainda acho, ao meu gosto, Os 12 Macacos um melhor. Só questão de gosto, reconheço que sou quase uma voz única nesse senntido. Baita crítica, como quase todas as suas, Koball. Parabéns.

Junior Ferreira | terça-feira, 07 de Julho de 2015 - 19:11

Que crítica foda, que filme foda!

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