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Críticas

Cineplayers

Um drama de visual belíssimo, mas extremamente artificial e praticamente sem vida.

6,0

Cold Mountain era, antes de seu lançamento, um enorme candidato a ganhar inúmeros prêmios ao redor do mundo. Ele foi criado, pode-se dizer, com esse propósito (mas não espere que os produtores da Miramax - ou mais particularmente Harvey Weinstein - digam isso publicamente). O objetivo maior, é claro, seria receber o Oscar de melhor filme, dia 29 de fevereiro de 2004. Infelizmente para a produtora, o tiro saiu pela culatra, e Cold Mountain teve que se contentar com "apenas" sete nomeações: cinematografia, edição, trilha sonora original, duas nomeações para melhor música, ator (Jude Law) e atriz coadjuvante (Renée Zellweger). As razões do porquê desse retumbante fracasso (se levarmos em conta as expectativas do estúdio, obviamente) serão analisadas logo em seguida.

Por ora, mais importante que saber dos prêmios que Cold Mountain poderia ganhar ou já ganhou, é saber que este é o novo filme do diretor Anthony Minghella, famoso em Hollywood desde 1996 quando ele e seu filme O Paciente Inglês receberam, de 12 indicações, nove Oscars. O Paciente Inglês é o típico filme "ame-ou-odeie": obra-prima para muitos; chatice total para outros. Três anos mais tarde, Minghella dirigiu o ótimo suspense O Talentoso Ripley, filme de grande sucesso crítico e bom sucesso comercial, que demonstrou o talento do diretor novamente. Cold Mountain cai mais para linha de O Paciente Inglês: drama de época, longo, extremamente sentimental (não necessariamente isso é bom ou ruim), de personagens fortes e tom épico.

Ao recriar, tão de perto, elementos já existentes em O Paciente Inglês, percebe-se de cara o objetivo do diretor e produtores: lançar mais um filme pra ganhar prêmios. É algo facilmente perceptível por quem conhece o histórico da produtora Miramax dos irmãos Weinstein: pega-se um bom romance (criar material original de qualidade não é pra qualquer um hoje em dia), um diretor que já deu certo em outra oportunidade, atrizes que estão em foco no momento (no caso, Kidman e Zellweger), coloca-se um bom orçamento e pronto! É o que os norte-americanos chamariam de "by the numbers", ou seja, algo executado seguindo um planejamento cuidadoso, sem desvios de percurso. Depois disso, é torcer para a crítica e o público gostarem. Não é questão de pegar no pé da produtora não, ela sempre fez isso, e todo ano lança um filme desse tipo. Pessoalmente, não considero uma má atitude, mas simplesmente algo irritante, forçado. Quem é prejudicado é o próprio filme, que acaba soando artificial em muitos momentos, com uma fórmula correta demais na maioria dos casos, não ousando com o roteiro, além de possuir uma lineariedade muito evidente, tornando-o previsível na maior parte do tempo.

Cold Mountain é isso: uma boa história, de momentos fortes e poderosos, interpretações bem acima da média, tem inúmeras frases de efeito, além de ser tecnicamente brilhante. Mesmo que seja longo demais, achei apenas algumas poucas passagens chatas ou irritantes. Filme mais correto que esse não é lançado há muito tempo. O problema é que, em sua corretude, ele em nenhum momento (ou quase) se destaca; em nenhum momento sai de sua estrutura linear e previsível para surpreender o espectador. Enfim, Cold Mountain não tem nada que o faça ser especial, merecedor dos desejados prêmios por parte da Miramax. Novamente, não é uma coisa ruim, e certamente o filme não perde pontos por isso - apenas deixa de ganhá-los.

Mas você que não tem nada a ver com os rolos da Miramax, e apenas quer saber se este é um bom passatempo ou não, deve estar se perguntando, caso ainda não saiba, sobre o que é exatamente Cold Mountain? Filme de guerra? Romance? Nem um, nem outro. Adaptação de um livro de mesmo nome (aqui no Brasil resolveram deixar o título não-traduzido, o que é no mínimo estranho), felizmente o filme consegue utilizar o tema já mais que vencido no cinema da Guerra Civil nos Estados Unidos (que ocorre desde 1915 com O Nascimento de uma Nação) de forma bem inteligente, apenas como pano de fundo para o romance entre Inman (Jude Law) e Ada (Nicole Kidman). Os dois apaixonam-se rapidamente, mas logo Inman tem que servir o Sul na guerra. Algum tempo depois, ele é ferido quase mortalmente e perde o contato por carta que tinha com Ada, até que um dia não aguenta mais a dor da separação e decide desertar do exército sulista.

O problema é que os desertores são caçados para serem enforcados, e Inman deve fugir por centenas de milhas, sendo caçado, enquanto encontra diversos personagens em sua longa jornada: o pastor pecador, muito bem interpretado por um de meus atores favoritos, Philip Seymour Hoffman; a viúva solitária, também bem interpretada por Natalie Portman, entre outras figuras que encontra pelo caminho. Portanto, o filme é antes uma aventura, um road-movie à pé, do que um filme de guerra ou romance. Em termos de interpretações, creio que todo o elenco, mesmo o coadjuvante, é em sua maioria bem montado e dirigido, com bons atores em papéis interessantes e escritos cuidadosamente (mais um fator "oscarizável" do roteiro). Jude Law tem o melhor papel e é o melhor ator do filme (foi indicado ao Oscar de ator principal), fazendo um personagem que simpatiza com o público facilmente. Posso dizer que torci o tempo todo para Inman conseguir retornar para casa, mesmo que no caminho ele perca toda sua inocência e pureza - coisas da guerra.

Enquanto Inman tenta retornar para sua cidade, lá o espera sua amada, Ada. Deprimida com a guerra e suas conseqüências (o filme não chega a retratá-las de forma enfática, dando prioridade sempre ao sofrimento de Ada do que à decadência da cidade), Ada tem como única motivação a esperança do retorno de seu amado, Inman. Até que chega Ruby (Renée Zellweger), de não se sabe onde, para levantar a moral de Ada e reconstruir sua fazenda abandonada. Ruby funciona mais como alívio cômico ao filme do que para levar a história adiante. Embora acabe adicionando novos personagens ligados a ela, como seu pai e amigos, todas suas cenas poderiam ser dispensadas numa boa do filme (não o são porque isso tornaria as cenas de Ada redundantes com o tempo). Fazendo o estilo de "mulher-macho", Ruby possui um sotaque irritante e uma expressão exagerada de Zellweger, que, vejam só, é a favorita ao Oscar de atriz coadjuvante por esse papel. É uma personagem forçada, certamente a mais fraca do filme, mas nesse caso a fórmula da Miramax funcionou, convencendo boa parte da crítica.

Tecnicamente Cold Mountain é uma conquista maravilhosa por parte da equipe de produção: efeitos especiais, fotografia, som e trilha sonora: todos esses elementos dão um show absoluto. As cenas de batalha, no primeiro ato do filme, são de tirar o fôlego. Há uma tomada onde os Ianques ou Nortistas tentam chegar ao acampamento Sulista, mas estão presos em uma enorme cratera - essa tomada possui uma iluminação magistral e um senso de grandeza incrível. Todo o filme é recheado de belíssimas paisagens, além de possuir um trabalho de maquiagem e vestuário de primeira (embora não se configure como destaque entre filmes sobre a Guerra Civil, como por exemplo Tempo de Glória, que também é tecnicamente incrível). A trilha sonora é, por vezes, linda. O cuidado é tanto que a própria atriz Nicole Kidman é quem toca as músicas no piano que sua personagem possui. Enfim, pelo menos nos requisitos técnicos de um filme feito pra vencer, pode-se dizer que Cold Mountain obtém o sucesso almejado.

No geral, este é um bom filme, recomendado para quem gosta de romances épicos e super-sentimentais, e não se incomoda com a lentidão dos acontecimentos nem com tramas muito longas. Há meia dúzia de cenas que poderão fazer os menos fortes chorarem como crianças. Esse tipo de coisa é uma qualidade muito positiva em premiações. O ruim é que a sensação de ser um produto pré-montado está em cada momento do filme, nas belas expressões de Ada, na cara feia de Ruby, no sofrimento de Inman. São bons personagens que sofrem de um destino previsível e artificial, portanto, mesmo com algumas características tão positivas, fica realmente difícil se entusiasmar com a obra.

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