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Críticas

Cineplayers

Feel good movie à brasileira.

5,5

Uma produção que tomou sete anos da vida do diretor Bernard Attal, A Coleção Invisível (idem, 2012) é uma obra modesta, que conta com poucos atores de grande porte e trata de um Brasil que não é comumente retratado nas grandes telas. Francês radicado no Brasil, Attal adaptou um conto do austríaco também radicado Stefan Zweig, que veio para o Brasil ainda na segunda guerra mundial.

Tal destino semelhante acaba dando a tônica da obra. A Coleção Invisível é um filme sobre deslocamento, de se sentir estranho em uma terra estranha. Beto, um técnico de som que sofre uma grande perda (cinco amigos seus morrem em um acidente de carro onde ele deveria estar) decide, ao entrar em contato com sua família certo dia, encontrar um velho colecionador amigo do seu pai, um colecionador de arte já falecido. Beto sairá de Salvador para conhecer um Brasil profundo e triste, devastado pelas pragas, crises e misérias, onde tanto senhores de terra uma vez poderosos e camponeses lutam para sobreviver após uma plantação cacaueira ser devastada pela Vassoura de Bruxa. Lá chegando, enfrentará uma longa jornada para ver a coleção do tal barão de terra, já que sua mulher e filha têm uma péssima impressão do homem da cidade grande.

Tal deslocamento não é físico, não transforma jamais A Coleção Invisível em Road Movie; é um deslocamento interior, que trata sobre personagens anacrônicos que jamais conseguem se adaptar. Attal dirige de maneira simples e direta um filme sobre autodescoberta e revisão de valores da vida, que nem sempre cumpre dramaturgicamente o prometido; o filme muda de rumo pelo menos três vezes, e há seqüências desnecessárias; a mãe de Beto, uma senhora carente de atenção, chega a ter seu peso dramático em certo momento da história, mas que logo se revelará perdido até que as rédeas sejam assumidas em direção à, unicamente, a tal coleção.

O pretexto dos colecionadores de arte acaba sendo menos importante do que o verdadeiro foco do filme: o par romântico e ao mesmo tempo antagonista dos desejos de Beto, Saada, compartilha com o protagonista a coleção de perdas e feridas e a superação à muito custo de situações particularmente difíceis. Uma pena que tal arco romântico seja explorado de maneira previsível e um tanto melodramática – a empatia mútua surge de maneira elipsada e repentina.

A ambigüidade do personagem também não é tão trabalhada assim – sabemos da sua angústia por ter perdido os amigos, e Brichta realmente soube defender como ninguém um personagem perdido e desorientado, levado pelas circunstâncias à outros lugares, outros contextos e outros pretextos. A dignidade da atuação não reflete tanto na dramaturgia, já que muitos dos seus conflitos nunca serão resolvidos.

Conto sobre as ilusões que mantemos em pé para que a vida possa parecer um pouco mais sustentável, a redescoberta jamais irá operar em todos os níveis em momento algum. Com o final aberto, fica pouco claro um filme que fez questão de explicar tanto a relação do personagem com amigos, família e desconhecidos para no final suspender com a partida do protagonista. Explica-se o ponto de partida, explicam-se os objetivos; o ponto de chegada lentamente vai se desfazendo com aquele tom típico de filme que não sabia mais para onde caminhar. Deixa-se na imaginação do espectador, no final das contas, como seria o novo Beto.

Apesar de ser bem intencionado e saber o que quer, talvez a modéstia não fosse a melhor resposta para A Coleção Invisível. Do jeito que saiu, ficou um filme desencontrado, que promete mas não recompensa, que planta mas não colhe e aproveita mal o potencial de grande parte dos seus personagens. Mas por uma cena ou outra, como a de Vladimir Brichta chorando após ver troncos queimados que se assemelham muito, imagética e proporcionalmente, aos sacos plásticos pretos que embalavam seus falecidos amigos do início do filme, que toma todo o tempo preciso, até destoando da simplicidade mecânica de grande parte da projeção para que o sentimento da cena seja sentido e jamais explicado em planos demorados e praticamente silenciosos, o filme sobe alguns pontos no geral. Mas, infelizmente, jamais empolga de vez e acaba perdido numa maré de mal aproveitamento e diálogos clichês.  Talvez, com o tempo, Attal consiga arrendondar seu estilo e não é improvável, com o potencial visto aqui, que sua produção suba de nível.

Visto no 14º Festival do Rio

Comentários (2)

Eduardo da Conceição | sexta-feira, 06 de Setembro de 2013 - 11:31

O Attal, Vladimir Brichta, Ludmila Rosa e a produtora do filme estiveram na minha faculdade numa conversa pra divulgar o filme. O Attal tem um sotaque quase incompreensível e o Brichta é muito descontraído.

E, pelas imagens que eu vi, achei estranho as imagens do sul daqui. Sei que a Vassoura de Bruxa acabou com muitas cidades, porém elas têm se reerguido e aberto grande espaço para o turismo. É o meu lugar favorito pra passar férias aqui na Bahia, as cidadezinhas do sul tem sempre um clima bem agradável e as ruas cheiram a chocolate (sim, sem brincadeira, você anda pelas ruas com o cheiro de chocolate).

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