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Críticas

Cineplayers

O castelo animado de Guillermo del Toro.

6,0
O mexicano Guillermo Del Toro se reveza na função de diretor-pipoca com talento o suficiente para se destacar entre os demais operários de estúdio e cineasta-autor não talentoso o suficiente para entrar no rol dos grandes diretores atuais. Caminhando nessa posição ingrata e incerta, ele por vezes obtém belos momentos de glória (Cronos [idem, 1993], A Espinha do Diabo [El Espinazo del Diablo, 2001] e O Labirinto do Fauno [El Laberinto Del Fauno, 2006]) e, em contrapartida, amarga alguns pontos mais baixos na carreira (os dois Hellboys e Círculo de Fogo [Pacific Rim, 2013]). O interessante é ver como agora com seu novo trabalho ele chega a um meio-termo exato entre seus dois lados antagônicos. O resultado não poderia ser outro: um filme morno.

A Colina Escarlate (Crimson Peak, 2015) trabalha simultaneamente esses dois lados de del Toro, pois traz uma proposta original, mas trabalhada em muitos pontos no piloto automático. A tentativa de construir uma obra gótica e de evidente influência de escolas literárias (com ecos de A Outra Volta do Parafuso e O Morro dos Ventos Uivantes, entre outros)  é sabotada a partir do ponto em que ele aposta tanto no visual que esquece dos personagens e atores. Como não poderia deixar de ser em se tratando de seu cinema essencialmente visual, A Colina Escarlate é um grandioso espetáculo estético, desde a cenografia, passando pelo figurino, até a fotografia esmaecida. E quem ganha mais com isso é o castelo habitado pelos personagens na maior parte do filme, milimetricamente idealizado por del Toro com seu teto aberto bem no centro do hall e seu terreno de argila escarlate. De tão espetacular, acaba por se tornar também o melhor personagem.

O horror no cinema ganhou ao longo dos anos a função de materializar em imagens o medo interior, questionar dilemas morais, e traduzir em assombrações questões de fundo social. O tom fabulista de O Labirinto do Fauno, por exemplo, foi uma forma encontrada por del Toro de exprimir os medos herdados de gerações assoladas pela guerra civil espanhola, e sua execução foi belíssima. Aqui em A Colina Escarlate ele não encontrou em seu conto de toque sobrenatural o mesmo tempero, embora demonstre conhecer do riscado ao rechear sua obra com referências diversas a mestres como Mario Bava, Roger Corman e até Alfred Hitchcock. Como dito por Edith Cushing (Mia Wasikowska), não é uma história de fantasmas, e sim uma história com fantasmas, e por isso a evidência está na relação conturbada entre o casal principal e a irmã estranha do marido (vivida por Jessica Chastain), não nas assombrações da mãe morta da protagonista. O fator sobrenatural está na colina, na casa, na escuridão dos ambientes, que refletem justamente a composição visual apurada de del Toro. Mas a questão principal é: em teoria, não é disso que tudo se trata?

Se em todo esse apuro estético de A Colina Escarlate não reside o foco do diretor, são os personagens de carne e osso que ele em teoria deveria priorizar, e é nesse ponto que o filme escorrega: nenhum deles é um personagem gótico exatamente, ou sequer bem matizado. Edith é praticamente uma Jane Eyre, que por sua vez é fruto de uma literatura pincelada pelo gótico, mas não de fato parte dele. De tão preocupado em construir uma atmosfera gótica (o que faz muito bem, devemos reconhecer), del Toro se esquece dos personagens, que são o ponto focal do roteiro. Parte disso se deve a um elenco irregular, sabotado pela presença anormal de Chastain, que está caricatural, forçada, ao mais lamentável estilo de vilã de novela mexicana. Sua personagem aos poucos ganha uma importância cada vez maior, e conforme isso ocorre o filme desmorona diante de uma presença tão destoante.

Isso nos obriga a buscar refúgio no visual e em especial no maravilhoso castelo que funciona como um organismo vivo e macabro, tal como o monumento expressionista de F.W. Murnau em O Castelo de Vogelöd (Schloss Vogeloed, 1921). As cores esmaecidas tingidas pelo vermelho escarlate da colina e dos fantasmas ensanguentados mancham o filme e o aproximam do tom de horror tão procurado pelo diretor. Resta saber se isso é mesmo o suficiente em um filme que não se diz sobrenatural por excelência. A habilidade com o horror del Toro já provou que tem, mas quando diante do tratamento que deve ser dado à sua protagonista cheia de conflitos (inclusive sexuais), seu talento se revela limitado. Nesse ponto, o verdadeiro horror desaba.

Comentários (12)

Luiz F. Vila Nova | domingo, 25 de Outubro de 2015 - 11:09

Hellboy 2 é apoteose visual do Del Toro.

MARCO ANTONIO ZANLORENSI | segunda-feira, 26 de Outubro de 2015 - 09:55

Os filmes de Guilhermo Del Toro geralmente tem um forte apelo visual e sempre algo mais, nesse filme esse algo mais não acontece, a superficialidade e a pobreza com que os personagens foram desenvolvidos é tocante, sempre que vou assistir a um filme do Del Toro crio expectativas pois o considero muito bom, não se pode ganhar todas.

jorge lucas | terça-feira, 27 de Outubro de 2015 - 16:16

Os dois Hellboy são fodas.

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