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Críticas

Cineplayers

Atentado em segundo plano; o Dia dos Patriotas.

7,0
É bem verdade que a carreira de Peter Berg não é lá muito atrativa, mas desde que o diretor decidiu deixar de lado produções fantasiosas e abraçou um tom quase que documental de histórias baseadas em fatos reais em seus últimos três filmes – todos protagonizados por Mark Wahlberg – ele parece ter encontrado um estilo, uma identidade. E não é que tem se saído melhor assim? São trabalhos que, se não se destacam pelo brilhantismo na direção ou pela qualidade como cinema construído, pelo menos possuem coração e temáticas relevantes o suficientes para receberam certa dose de atenção.
 
No caso de O Dia do Atentado (Patriots Day, 2016), o diretor revive os dias de horror que Boston viveu em abril de 2013, durante sua tradicional maratona, quando duas bombas caseiras explodiram perto da linha de chegada e causaram três mortes – entre elas uma criança de apenas oito anos - e deixaram mais de duzentos e cinquenta feridos, muitos amputados. Wahlberg assume a personalidade de Tommy Saunders, um policial que está no último dia de trabalhos mais simples forçados como uma punição administrativa, mas assume uma função de ligar a toda forma narrativa que o filme busca em tantas histórias reais paralelas como um personagem fictício.
 
Isso é um acerto: ao apresentar seus personagens desde cedo, mesmo que eles só venham a ter alguma função dentro da trama lá na frente, o filme humaniza aquelas pessoas, nos fazendo conhecer suas rotinas, seus planos, seus sonhos, tonando os momentos de tensão mais eficientes, afinal, sabemos o que eles podem ganhar ou perder com aquilo que está em tela. Então, quando vemos Jeffrey Pugliese (J.K. Simmons) comprando muffins e donuts no começo para a esposa ou então o jovem policial Sean Collier (Jake Picking) finalmente tomando coragem de chamar uma pretendente para sair ganha-se peso dramático com os destinos que eles encontrarão quando os terroristas cruzarem os seus caminhos.

O que poderia ser uma ode à potência militar norte-americana mostra-se um filme muito mais sensível do que isso. É simples: o terror é imprevisível, ainda mais quando parte de duas pessoas que agem por iniciativa própria, sem nenhum grupo radical por trás, apenas idealismos, o que torna ainda mais difícil rastreá-los senão pela casualidade. Quando Berg passeia com sua câmera pelas ruas labirínticas da cidade em uma tomada superior, vemos as imensas possibilidades e a dificuldade da tarefa. É aí que a cidade torna-se um importante membro da história: mesmo com toda sua tecnologia, toda a sua potência bélica, foi a população de Boston uma das principais peças chaves para que tudo não tomasse uma proporção ainda pior. Dependeu-se de um chinês de perninhas curtas correndo em um determinado momento ou então de um senhor mais atento. Não muito mais.

Quando o filme dialoga a favor da população, e não das iniciativas militares, fica um pouco mais fácil entender o personagem de Wahlberg: ele é a população. Provavelmente com uma punição administrativa por agir mais com o coração do que com a cabeça, como muitos cidadãos agiriam nessas situações, ele tem momentos chaves por conhecer bem aquele local, ligar pessoas totalmente desconhecidas através das informações em comum e estar presente em todos os momentos que todo mundo gostaria de estar quando querem agir pela justiça. É um policial comum, nada heroico, com um certo problema com sua esposa e um joelho que o impede de ser o estereótipo atlético que estamos acostumados a ver nesse tipo de filme. Ele é uma pessoa comum.
 
Para nós, brasileiros, fica ainda mais fácil criticar o patriotismo que os norte-americanos têm diante dessas situações, afinal, vivemos em um país em paz, com muitos problemas internos mas praticamente alheio a tudo o que acontece de violência no mundo, vide Copa do Mundo e Olimpíadas sem um caso sequer registrado de terrorismo. Mas para os norte-americanos, mesmo que em um filme direto demais, meio meloso aqui ou ali, adotando postura documental em legendas e em montagens de imagens que misturam o real e a ficção sem muita distinção, com fotografias que flutuam entre imagens em HD, imagens de arquivo e de câmeras de segurança, é um filme registro importante e orgulhoso, pois poderia ter sido muito pior. Poderia ter sido mais uma ferida no orgulho, mas deu ainda mais força a esse Dia dos Patriotas.

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