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Críticas

Cineplayers

O humor crítico se perde, mas quando bem feito é hilariante.

5,5

Sacha Baron Cohen é uma figura necessária tanto para a comédia atual quanto para as artes. Apesar da roupagem mercadológica de seus filmes, com ações promocionais que comprovam tal intenção, Sacha é capaz de romper com o politicamente correto - e assim elevar o nível do humor - e também é um contestador nato da política, da cultura norte-americana e das organizações sociais. Assim, mesmo que se percam em muitos momentos, as obras protagonizadas por Sacha trazem um humor necessário.

A idiotização, por assim dizer, dos norte-americanos é o principal foco de crítica de Sacha desde o excepcional Borat - O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América (Borat: Cultural Learnings of America for Make Benefit Glorious Nation of Kazakhstan, 2006), falso documentário sobre um repórter do Cazaquistão em visita aos Estados Unidos. Depois, com Brüno (idem, 2009), escorregou em muitos momentos no nível das piadas, mas continuou a criticar a cultura vazia que domina a Terra do Tio Sam. Em O Ditador (The Dictator, 2009), Sacha se fixa entre o primeiro e o segundo. Tiradas muito inspiradas e com potencial crítico dividem espaço com situações de mau gosto e sem significado real.

Aladeen, interpretado pelo comediante, é um ditador africano avesso à democracia, à diversidade e a Israel. Com essas características, sobram citações e referência a figuras conhecidas da história como Saddam Hussein, Muamar Kadafi e Mahmoud Ahmadinejad. Como se nota, a crítica é atual e não poupa ninguém. Muito menos, claro, a política externa dos Estados Unidos. As piadas, apesar de fortes, não são agressivas justamente por, no fundo, tirarem sarro da figura “imponente” de ditadores e também de países que consideram o mundo como quintal de seus territórios.

Pena que o próprio roteiro, responsável pelo mar de piadas inteligentes, peca por ser quadrado, o que a edição frágil tratou de evidenciar ao deixar as passagens marcadas demais. A continuidade da história não flui de maneira orgânica. Soma-se a isso a mensagem equivocada que certas passagens podem transmitir ao espectador. Quando já perdido em Nova Iorque e acolhido pela ativista Zoey, por exemplo, Aladeen tenta agradá-la e impõe seu jeito tirano – e desumano – para organizar a loja da moça. O resultado positivo leva o espectador ao imediato questionamento: estaria o filme de alguma forma defendendo a eficácia deste modelo? Pela toada geral, a resposta parece negativa – que bom.

Outro ponto imperdoável é a recorrência a piadas escatológicas. Nestes momentos, o enredo se perde por fugir completamente do discurso político crítico – e hilariante – e substituí-lo por uma comédia de costumes mais apropriada para Borat. Se, quando Sacha aparece na mesa de jantar com fezes em um saco plástico, o público ri por entender a proposta de choque de costumes, o mesmo não acontece quando o falso Aladeen bebe sua própria urina na ONU. A sensação desta vez é de estarmos vendo não mais que uma piada de mau gosto.

Entretanto, a sátira em relação às instituições diplomáticas, em especial a própria Organização das Nações Unidas, é excelente por escancarar a inoperância dessas entidades em questões políticas delicadas, como a intervenção e a sanção em países que infringem direitos humanos (o caso mais atual foi da Síria). Todos os membros do Conselho de Segurança permanente defendem seus próprios interesses econômicos, tanto para intervir quanto para vetar. Por isso, Sacha expõe a ONU como um grande balcão de negócios escusos, a serviço do interesse duvidoso de chefes de Estados.

Assim, o ator/roteirista caminha para o desfecho de crítica aberta à hipocrisia e à falsa democracia norte-americanas (em passagem que lembra, e muito, a emblemática e belíssima cena de Charles Chaplin discursando em O Grande Ditador [The Great Dictator, 1940]). O filme mostra que certos regimes atuais são semelhantes aos totalitários satirizados por Chaplin, assim como as democracias podem ser ambientes igualmente opressores. O discurso de Aladeen é impactante por descontruir os argumentos norte-americanos e mostrar que o “expoente da democracia e das liberdades” age exatamente do mesmo modo que os alvos de suas críticas. 

Apesar de acertos incontestáveis como esse – o filme dificilmente erra na sátira política -, a mensagem final é mais do que óbvia e até certo ponto enlatada demais. O Ditador conclui que nem a política nem a religião são os caminhos para encontrar a solução, apenas o amor entre os povos será capaz de cessar conflitos racionalmente inexplicáveis. É piegas, mas talvez verdadeiro. Ao final, deixa a impressão de que a crítica se perdeu em algum lugar para encaixar a narrativa em um padrão no qual o próprio alvo de Sacha, o cidadão médio norte-americano, seja capaz de assimilar e gostar – talvez sem perceber todas as cutucadas do texto. Assim, apesar de garantir ótimas risadas, os momentos de reflexão são sabotados por um roteiro mais preocupado em entreter, seja quem for. 

Comentários (6)

Wellington Conegundes da Silva | quarta-feira, 29 de Agosto de 2012 - 18:36

Acho que o maior problema na sua resenha era que você estava esperando um filme dentro de moldes técnicos e cinematográficos de humor que Sacha simplesmente não se importa e implode. É tão óbvio, que como comédia romântica ele é a aversão de si mesmo, de modo a implodir o senso tolo de que o bem tem que vir sanar os problemas e da uma lição de moral e inspirar. Isso ficou tão claro pra mim, que uma dada altura me lembre do Príncipe em Nova Iorque.
Como o próprio disse, só o suportam, ou dão espaço pra ele, porque ele dá lucro, ou seja, sua condição como humor não é conciliar, mas implodir senso comum e não dar coro a uma forma inteligente, que agrade os formadores de opinião, mas que caia correndo sob todas as formas.

Bruno Bernardes | quinta-feira, 30 de Agosto de 2012 - 18:59

filme muito engraçado , apesar de ter várias cenas meio que bobas vale muito a pena conferir.

Vinícius Aranha | sábado, 29 de Dezembro de 2012 - 03:48

É divertido, com certeza, mas Sacha Baron Cohen nunca devia ter se rendido às convenções hollywoodianas assim. Desse jeito, o filme soa apenas superficial em tudo que sugeria ser.

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