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Críticas

Cineplayers

Na Cabeça de Riley.

7,0

Antes de Divertida Mente, eu gostaria de dedicar algumas linhas ao curta-metragem que o antecede, Lava. Certamente este será o curta menos popular talvez de toda a tradição da Pixar. Mesmo na sessão de imprensa as risadas constrangidas já se faziam presentes. Ora, eu mesmo compartilhei delas. É tentador rir da tolice ingênua, e a Pixar não poderia nos culpar, tendo ela mesma, e bem conscientemente, ajudado a limpar essas bobagens do cinema de animação. Nas últimas duas décadas, pelo menos, os grandes estúdios descartaram cheios de orgulho histórias como a de Lava, eles tinham ideias mais inteligentes e cínicas ao seu dispôr, ansiosos por serem proclamados inovadores. Não sei o que Divertida Mente significa para a Pixar, se de fato o fim da crise (como muitos comemoraram no Festival de Cannes) ou apenas o melhor momento dela. Mas sinto que, ao evocar tão corajosamente o cinema de animação pequeno e ignorado que a Disney produziu durante a Segunda Guerra Mundial, de filmes como Johnnie Fedora and Alice Bluebonnet e Once Upon a Wintertime, Lava marca o fim da animação que se esforça para ser inovadora.

Divertida Mente, no entanto, pode me contradizer com facilidade. Desde que o tema do filme foi anunciado, junto ao curioso título Inside Out (tragicamente traduzido), brincava-se que a Pixar estaria tentando algo como A Origem. A complexidade óbvia da premissa de fato segura o filme no campo das coisas que não são tão inteligentes quanto pretendiam ser. Mas Divertida Mente é inteligente o bastante, e o universo que criou a partir da premissa funciona quase sempre.

Os protagonistas do filme são sentimentos: Alegria, Tristeza, Nojinho, Medo e Raiva. Os cinco são responsáveis por controlar as emoções e respostas de Riley, uma garota de classe média americana. Quando vi o trailer, achei que os personagens-sentimentos corriam o risco de ser superficiais, por motivos óbvios. Mas não é o que acontece, o texto os desenvolve com complexidade, principalmente as antagonistas Alegria e Tristeza, que lembram a dupla Woody e Buzz em Toy Story pelo desenvolvimento conflituoso (e muito honesto) da aliança entre elas. Alegria, além da sua característica evidente, é também egoísta e manipuladora, imagino o quanto a voz de Amy Poehler deve potencializar a personagem (Alegria é meio que uma versão Pixar de Leslie Knope, personagem de Poehler na série Parks and Recreation). E Tristeza, definitivamente minha personagem preferida, tem uma doçura encantadora.

Por outro lado, Riley é uma personagem horrível e bem macabra. Tive muita dificuldade em estabelecer qualquer empatia por ela. Enquanto os personagens que vivem na sua cabeça são responsáveis por tudo o que a garota pensa a partir de uma engenharia cuidadosamente estabelecida pelo filme, resta a ela, e a todos que a cercam e convivem com ela, não ser mais do que um robô meticulosamente controlado. É assustador. Se toda a sociedade dela se dá da mesma forma (como sugere as gags dos créditos finais) então não é com A Origem que Divertida Mente se assemelha, a animação estaria mais perto de Matrix. Quando Riley “funciona” (ou seja, tem amigos, pratica esportes, brinca com os pais e ama a família), ela não passa de um padrão do que o filme entende que uma garota de 11 anos deveria ser e como deveria agir. E todas as sacadas do filme só reiteram sua natureza robótica.

Dentro de Riley, pelo menos, vive a riqueza de universo único e personagens sinceros que estava ausente do estúdio desde 2010. É bom finalmente reencontrar as possibilidades do imaginário Pixar, e não pela insistência na inovação, mas pelo potencial criativo e pela fidelidade única que a Pixar confia ao mundo criado. Espero que O Bom Dinossauro, prometido para ainda este ano, já não sofra nada com o peso da obsessão pelo novo.

Comentários (16)

Pedro Henrique | quarta-feira, 01 de Julho de 2015 - 03:35

cheguei atrasado no cinema, perdi o curta ...

Augusto Barbosa | quarta-feira, 01 de Julho de 2015 - 18:12

Também perdi o curta.

Pete Docter: o negócio agora é ficar de olho em qualquer projeto que esse cara dirija na pixar. Não chega superar Up - ainda a grande obra-prima do estúdio - mas este aqui figura no primeiro escalão, fácil fácil.

São muitas boas ideias que este aqui tem, mas a produção de sonhos é insuperável - genial o filtro de realidade.

Ah, e é a animação menos engraçada da Pixar.

Gian Luca | quarta-feira, 15 de Julho de 2015 - 00:03

O filme realmente me surpreendeu pela originalidade e ousadia, principalmente em não tentar ser engraçado o tempo todo. A minha sessão estava cheia de crianças, mas percebi que poucas realmente entendiam certos lances. Melhor assim. É melhor a Pixar continuar nivelando por cima. Animação impecável.

Obs: Também preciso rever na versão original.

Paulo Faria Esteves | quarta-feira, 15 de Julho de 2015 - 22:29

Estou surpreendido pela recepção que o filme está a ter aqui no CP. A verdade é que não esperava grande coisa deste filme, quer pela ideia quer pelo trailer. Nem espero, ainda...a ideia de X personagens, cada uma com a sua característica pessoal, se juntarem para tomar uma decisão é mais velha do que andar para a frente. Qualquer pessoa que tenha lido 10 gibis da Disney nos últimos 15 anos sabe que esse tema está bastante desgastado e já foi explorado de mil maneiras. Havia os 7 anões, havia o clássico anjo vs. demónio das personagens da Disney, etc. Portanto, não me parece que estes filme tenha muito por onde se lhe pegue.

Mas estes comentários sempre animam!😁 Talvez esteja redondamente enganado. Vou esperar para ver...

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