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Críticas

Cineplayers

Descubra quem você é, e seja de propósito.

5,0
Para a adolescente plus size Willowdean, nada é mais sagrado do que as canções de Dolly Parton, nem mesmo as opiniões de sua mãe, uma ex-rainha de concurso de beleza que em nada se assemelha a ela e a apelida de “dumplin”, uma referência a um bolinho irlandês redondo e gordinho que por si só já deixa claro que existe um misto de carinho e desdém na forma como ambas se enxergam e se tratam. Enquanto finge não ligar para a pressão de viver como a filha de um ícone de beleza da comunidade local, a jovem encontra nos acordes de seu grande ídolo country e feminista todas as repostas para seus maiores anseios, e em um súbito momento de coragem – e descuido! – ela decide se inscrever na nova edição do concurso de beleza que premiou sua mãe em 1993. Dumplin’ (idem, 2018) nasce a partir desse inusitado plot para se propor a mostrar aquilo que todos sabem, mas parecem nunca se lembrar: a beleza está nos olhos de quem vê. 

Se a intenção da diretora Anne Fletcher era contar uma história de combate aos opressivos padrões de beleza impostos pela sociedade, muito fica apenas no campo da intenção mesmo. Pode parecer inteligente escalar Jennifer Aniston, uma das atrizes mais belas do cinema americano, para interpretar uma mãe suburbana que nunca conquistou nada de significativo na vida além de um troféu em um concurso regional há 25 anos, assim como colocar de protagonista uma atriz desconhecida e totalmente fora do padrão de beleza vendido por Hollywood, mas o aproveitamento desse elenco nunca vai além do óbvio denunciado na própria sinopse. O que poderia trazer algo de interessante para a narrativa era a trilha sonora toda composta por canções de Dolly Parton, uma artista que a vida toda pregou a igualdade feminina e plantou em seus fãs a semente do amor próprio, mas mesmo nesse arco o filme não se empenha para além do superficial. 

Willowdean é, para todos os efeitos, apenas uma adolescente descontente com a própria aparência e procurando ser aceita pela mãe, assim como achar um namorado bonito, inteligente, alto, forte, simpático, trabalhador e que saiba enxergá-la para além de seu peso. Que fácil fica quando esse menino dos sonhos cai de paraquedas na história e transforma a narrativa em um desesperado empenho de uma garota para estar à altura dele. Enquanto o galã é pintado como o cara sensível que entende a menina mais do que ela própria, ela acaba como a desequilibrada em busca da aceitação geral por meio de um concurso. Nesse ponto o filme se trai, ao fazer de Willowdean cada vez mais uma garota padrão de qualquer romance adolescente, se enquadrando aos poucos no protótipo de uma protagonista popular, bem aceita e que enfim prova que é sim bonita não importa o que digam. 

O perigo dessas histórias que se dizem combativas é que no fim das contas elas acabam se tornando tudo aquilo que supostamente condenam, sempre encaminhadas para uma conclusão conciliadora na qual a protagonista desajeitada passa a ser aceita como parte da massa, livre de qualquer preconceito, em um mundo cor-de-rosa em que as pessoas mudam de ideia do dia para a noite. As diferenças jamais são exaltadas como positivas, o fora do padrão é sempre triste e fracassado, a solução é sempre se encaixar no papel que lhe permitem. Para tudo ficar animado, é claro, basta jogar um núcleo estereotipado de drag queens que performam como Dolly Parton e abrem os olhos da garota, que passou a vida inteira ouvindo a cantora, mas nunca foi inteligente o suficiente para entender sozinha as mensagens de empoderamento nas músicas da diva do country. 

Dumplin’ versa muito sobre a importância da autenticidade, da valorização da identidade, não importa qual seja ela, não importa seu peso ou popularidade, mas no fim larga mão de todas essas bonitas mensagens para seu público-alvo ao resumir a felicidade da protagonista a um sonho pelo cara perfeito e pela benção da mamãe. Afinal, é fácil ser quem se é quando a vida de repente coloca em seu caminho a materialização de todos aqueles sonhos que sabemos que só ocorrem nos filmes e com as meninas magras, bonitas, louras e autoconfiantes. 

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