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Críticas

Cineplayers

Fica muito perto de ser a nova obra-prima do sub-gênero gângster. Ridley Scott em seu melhor filme desde Gladiador.

8,0

Ridley Scott, com American Gangster, entra no rol de grandes diretores que possuem também grandes filmes sobre a máfia. O Gângster não deveria ser chamado de obra-prima, mas é poderoso o bastante para ser citado como um dos grandes filmes deste sub-gênero, que o cinema americano sempre soube retratar tão bem desde que os próprios gângsters surgiram, lá pela época em que Howard Hawks dirigiu a versão original de Scarface em 1932. American Gangster é denso, tem diálogos fortes que soam bastante naturais dentro do mundo que nos é apresentado e também é muito bem interpretado. Um dos grandes filmes de 2007, sem dúvida.

Agora, apesar de ser dono das qualidades acima citadas, é inegável que American Gangster é uma reciclagem de um “n” número de filmes considerados obras-primas. Pode-se citar, sem muitas dificuldades, Operação França (todo o background policial), Scarface (um “ninguém” criando um império das drogas) e Os Intocáveis (um grupo de policiais desacreditado parte para uma das maiores investigações de todos os tempos). Isso sem falar de Os Bons Companheiros, O Poderoso Chefão... Mesmo que a originalidade não seja o forte do trabalho de Scott, seria injustiça negar que essa mistura é cheia de qualidades positivas, além de ser cinema de primeira classe, daqueles trabalhos que os cinéfilos assistem com gosto e prazer, estufando o peito e repetindo: “é por isso que o cinema existe”. O ato final, principalmente, é estupendo, um dos melhores clímax dos últimos anos.

O filme, que faz questão de dizer ser baseado em fatos reais logo em seu começo (o que sempre soa um tanto aproveitador em minha opinião), conta a história do primeiro grande gângster negro dos Estados Unidos que, em plena Guerra do Vietnã, aproveitou a caótica situação em que se encontrava a sociedade norte-americana para passar por cima de todos e vender pó-branco de altíssima qualidade por um preço baixíssimo, trazendo a ira dos competidores. Sempre se mantendo nos bastidores e evitando aparições públicas chamativas (cometeu esse erro uma única vez, o que acabaria por, indiretamente, criar o seu abismo mais tarde), Frank Lucas (Denzel Washington) conseguiu montar um império das drogas a partir “do nada”, assim como Tony Montana o havia feito em Scarface.

Contando com muita competência a história da ascensão de Frank Lucas e paralelamente a história da investigação de narcóticos chefiada pelo detetive Richie Roberts (Russel Crowe), o diretor Ridley Scott em cooperação com o roteirista Steve Zaillian (que fez maravilhas como Gangues de Nova York e A Lista de Schindler, só para citar dois) conseguiram fazer de um filme de mais de 150 minutos de duração um trabalho ritmicamente quase perfeito. Apesar de contar com alguns clichês e exageros dramáticos aqui e ali (situações já comuns a esse gênero de filme, talvez difíceis de serem evitadas mesmo para os melhores e mais originais escritores), as duas histórias são ótimas, sendo ajudadas, é claro, pelos dois atores à frente delas, ambos conquistadores de grande reconhecimento no cinema contemporâneo, incluindo o Oscar.

Filmado com planos elegantes e clássicos (nada do estilo “câmera trêmula”, moda entre cineastas em ascensão), O Gângster foi beneficiado por um Ridley Scott inspirado. E pensar que Antoine Fuqua fora cotado para a direção do filme há alguns anos. Mesmo competente, as chances de Fuqua em diminuir a história seriam imensas. Sobre Scott, pode-se dizer que é seu melhor filme desde Gladiador, que não coincidentemente filmou também ao lado de Russel Crowe (Um Bom Ano, de 2006, também contou com a presença da dupla na direção e protagonização). Outro ponto a favor foi a relativa falta de censura do filme. Mostrando sangue e nudez em bom número, mas nunca abusando desses elementos, Scott decidiu manter a classe ao mesmo tempo em que não poupou os espectadores do lado feio do mundo do crime, o que foi uma decisão acertada – um filme bastante gráfico, mas sem apelacionismos.

Em relação ao roteiro, ele é competente em conseguir manter um enorme número de coadjuvantes e várias pequenas histórias paralelas sem sobrecarregar demais o espectador. É um trabalho de fácil acompanhamento que sequer exige uma releitura (leia-se: assistir uma segunda vez) para ser totalmente apreciado. Outro ponto a favor, já que o gênero sempre costuma intrincar suas histórias, na maioria das vezes desnecessariamente, acrescentando personagens apenas para trazer uma complexidade que ninguém realmente gostaria de ver à história. Ao final de American Gangster, creio que a maioria das pontas tenham sido bem amarradas, embora alguns personagens e sub-enredos tenham ficado subdesenvolvidos, como a mãe de Frank Lucas ou a relação pai-filho de Richie.

O Gângster é cinema de primeira qualidade. Um filme com um ato final de tirar o fôlego, roteiro muito bem construído e dirigido e interpretado por profissionais em boa forma. Não é original em absoluto, mas isso tira apenas um pouco da força desse que é o melhor filme de Ridley Scott desde Gladiador (ambos são diferentes e fica difícil compará-los diretamente, por isso nem vou tentar isso agora). Scott poderia agora se aposentar tranquilo (é claro que esperamos que ele não faça isso), pois faz parte de um seleto grupo de diretores que deixaram sua marca na história do cinema com grandes filmes sobre gângsters ou a máfia. Não é uma obra-prima, mas fica poucos passos aquém disso.

Comentários (4)

Cristian Oliveira Bruno | terça-feira, 26 de Novembro de 2013 - 16:35

Dois atores/personagens facinantes num filmaço de um dos grandes diretores ainda na ativa.

MORENO | domingo, 27 de Setembro de 2015 - 08:32

Esta realmente perto de uma obra- prima, excelente filme Washington e Crowe atuam muito bem em seus personagens, gostei da trilha sonora com muito soul dos anos setenta.

Ricardo Viana Costa | segunda-feira, 18 de Junho de 2018 - 09:12

Howard Hawks dirigiu a versão original de Scarface?? Tem certeza??😁😁

Daniel Dalpizzolo | segunda-feira, 18 de Junho de 2018 - 09:32

Sim, Ricardo: http://www.cineplayers.com/filme/scarface--a-vergonha-de-uma-nacao/948

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