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Críticas

Cineplayers

Uma produção cheia de equívocos, que consegue ser o pior filme do diretor Steven Spielberg.

3,0

Demorou bastante tempo até que eu finalmente resolvesse escrever sobre “Guerra dos Mundos”. Esperei colocar as idéias em ordem e tentar diluir a impressão inicial que tinha ficado com o filme. Mas não adiantou. É uma pena chegar à conclusão que este é o pior trabalho da carreira de um dos meus cineastas favoritos.

O famoso livro homônimo ao filme, de H.G. Wells, já tinha sido transposto para a telona pelas mãos do cineasta Byron Haskin em 1953, em uma produção que é considerada um pequeno clássico da ficção científica. Na época, a invasão marciana em nosso planeta era uma metáfora perfeita que ilustrava bem a Guerra Fria – os americanos, defensores do capitalismo, da moral e dos bons costumes, contra os russos, ou “marcianos”, pregadores do comunismo e devoradores de criancinhas.

Foi apropriado então que Spielberg retomasse a mesma história na América pós 11 de Setembro, abatida, fragilizada e paranóica, reciclando a velha metáfora para os dias atuais. Ele, que tem pelo menos uma obra-prima quando o assunto são seres extraterrenos (“E.T. – O Extraterrestre”) e outra muitíssimo bem apreciada (“Contatos Imediatos de Terceiro Grau”) voltou ao mesmo tema. Só que dessa vez, nada de seres bonzinhos pedindo para voltar pra casa. O negócio é guerra.

E como guerra em Hollywood é sinônimo de arrasa-quarteirão, e ninguém melhor que Tom Cruise para encabeçar um projeto desses, a parceria entre o mais bem sucedido cineasta de todos os tempos com o maior astro de todos os tempos estava retomada – eles já tinham feito juntos o ótimo “Minority Report – A Nova Lei”. Mas o resultado não foi lá o que todos esperavam. Com uma produção apressada – foram apenas 11 meses entre o início das filmagens e a conclusão da pós-produção – e ao custo de 130 milhões de dólares, o filme falha em praticamente todos os pontos, tornando-se uma grande decepção por se tratar de uma obra de Spielberg. Como produto, foi bem em seu final de semana de estréia e deve faturar alto.

O maior problema é o roteiro. Escrito por David Koepp (fraquinho roteirista de filmes como “Olhos de Serpente” e “Janela Secreta”, mas também dono do ótimo script de “Homem-Aranha”) e pelo novato Josh Friedman (que antes só tinha idealizado o filme “Reação em Cadeia”), o filme não sabe qual tom assumir quando uma invasão alienígena é acionada em uma pequena cidade americana. Enquanto as máquinas de destruição alienígenas têm um design charmoso, super retrô (em uma clara alusão aos filmes de ficção do passado), o filme se leva a sério demais o tempo todo. Ficamos com saudades das brincadeiras de Will Smith no divertidíssimo “Independence Day”, por exemplo. Um pouco mais de humor faria muito bem à produção. Até porque tudo o que está na tela nos leva a pensar desse modo.

E não teria como ser diferente. O cineasta que um dia já foi o mais criativo e ousado de sua geração agora é regido pela segurança e pelo comodismo. Pois é muito fácil querer mostrar os humanos sendo dizimados através de lasers desintegradores. Sangue? Nem pensar. E o que dizer do final mais estúpido da história, que consegue ser pior que aquele mostrado em “Inteligência Artificial”?

São tantas as falhas que é impossível pensar que este filme tem a assinatura de Spielberg. Desde figurantes perdidos em cena, passando por ETs idiotas que perseguem humanos, máquinas escondidas no subsolo, trovões que levam cápsulas, espelhos que surgem providencialmente e árvores no meio do nada que impedem o impacto de uma gaiola de humanos! E a idéia de fertilizantes a partir de sangue humano é, no mínimo, risível, assim como a resolução que mostra como a própria natureza se encarregou de derrotar os invasores – pelo menos na forma como está mostrado na tela.

E pensar que o filme ainda conta com um terrível Tim Robbins no momento em que o filme se assume uma cópia de “Sinais”, aquele filme meia-boca do M. Night Shyamalan (e é nessa parte da história que Spielberg reutiliza a genial tomada de câmera que ela já tinha usado em “Jurassic Park”). Robbins, com arma em punho, barba por fazer e cara de alucinado, fazendo embate com Cruise, consegue ser a pior coisa do filme. Já o astro mostra a habitual garra de sempre e não compromete nunca, mesmo não conseguindo espaço para mostrar a redenção do seu personagem, que foi jogada pra escanteio – assim como toda a ótica intimista da trama. A gracinha Dakota Fanning não faz outra coisa além de gritar durante o filme todo e Miranda Otto tem participação discreta. Marcante mesmo ficou a narração em off de Morgan Freeman durante o prólogo e o epílogo, em um dos poucos bons momentos desta produção cheia de equívocos.

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