4,0
José Alvarenga Jr. saiu da zona de conforto em 2018. Depois de anos dirigindo comédias de extremo sucesso, 10 Segundos para Vencer e esse novo Intimidade entre Estranhos sugere uma inquietação narrativa, um deslocamento que pretende olhar para outros gêneros e outras formas de encarar a própria cinematografia. Após a biografia de Eder Jofre, ele embarca na ousadia de promover um conjunto maior de escolhas estéticas e um conjunto de categorias diversas num mesmo produto, mas com uma certa coerência. Tem organicidade na mistura e o roteiro não engasga quando amalgama os pontos. Mas esse mesmo roteiro tem sim problemas, e eles não são poucos. Saem ilesos da empreitada o trio de protagonistas, mas é um ponto quase único de defesa.
O filme foi escrito por Matheus Souza, cineasta, roteirista e dramaturgo muito jovem que tem no currículo os igualmente muito jovens Apenas o Fim e Eu Não Sei Exatamente o que Estou Fazendo com a Minha Vida, que descrevia uma realidade muito próxima a uma geração chamada hoje como millenium; provavelmente esse roteiro seria uma pretensa passagem para o universo adulto, mas ao mesmo tempo em que o longa constrói três personagens humanos e criveis, também recheia a ação dos acontecimentos de maneira infantilizada e pouco realista. Nasce então um híbrido estranho, que parece perdido entre sua estrutura de fundação e um desenvolvimento pouco maduro, que aos poucos desfaz sua credibilidade. Alvarenga tenta criar uma atmosfera de acolhimento imagético e até constrói planos convincentes, mas o filme não sobrevive ao seu esgarçamento.
Abrindo um leque de possibilidades com o triângulo amoroso que é passo a passo construído entre o casal Maria e Pedro, junto com o adolescente Horácio que é o síndico do prédio para onde se mudaram, o filme é mais um longa a se propor a falar de forma séria e consciente sobre a depressão, o isolamento auto-infligido e a distância das grandes cidades. Maria é uma decoradora carioca que está de volta ao Rio de Janeiro porque o marido Pedro finalmente conseguiu um papel em uma novela, mas que não esconde dele o desconforto com esse retorno. Ao conhecer o arredio Horácio, Maria encontra distração nas tardes solitárias para ambos, e o envolvimento natural entre os três é conduzido com elegância. O que entope o filme são as curvas que cada um deles adquire, nada condizentes com as personalidades criadas com esmero. Com isso o talento empregado se torna obsoleto, já que o filme se despedaça.
Tecnicamente é um filme cuidadoso, uma trilha sonora muito inspirada composta pelos músicos Roberto Frejat e Leoni, algumas belas cenas (tudo que envolve música no filme tem um tratamento acima da média - e como é prazeroso ver um projeto que nutre carinho pelo 'Louco Amor' da Gang 90) e enquadramentos que traduzem todo esse cuidado; Alvarenga é experiente e mostra que atingiu um patamar como realizador que o coloca acima da média geral. Infelizmente o mesmo não pode ser dito do material escrito que ele tinha em mãos, que precisava de lapidação maior e mais detalhada, para alinhavar sua estrutura promissora.
Como dito anteriormente, a entrega dos seus protagonistas salva o filme de um destino mais cruel. Renata Mandelli, uma atriz que surgiu na década passada em Malhação, tem pela primeira vez um protagonismo e se mostra merecedora da atenção dos produtores de elenco, mostrando uma sensibilidade ímpar em papel difícil. Milhem Cortaz parece estar cada vez mais a vontade de novo; depois de um longo período de repetição, o ator passou a escolher projetos nada óbvios que estão lhe acendendo caminhos novos e frescos em sua trajetória. O jovem Gabriel Contente também vem da novelinha adolescente na temporada atual, e aqui confirma seu potencial de revelação, sem ousar ou esticar as pernas para nenhum lugar longe, mas definitivamente seguro e confortável. Três personagens formidáveis, que contaram com desempenhos especiais (e a preparação de Fátima Toledo), mas que o filme não soube dar a eles um rumo digno de seus desempenhos; toda a dedicação com temas, direção e do trio parecem desperdiçadas.
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