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Críticas

Cineplayers

Noah Baumbach em plena forma.

8,0
Despontando pro cinema no encalço de Wes Anderson, Noah Baumbach também costuma lançar olhares em relações disfuncionais entre membros de uma família. Sem recorrer a uma estética tão rígida e maneirista quanto a de Anderson, ele busca registrar suas imagens com mais naturalidade, na esperança de chamar ainda mais atenção para a história e seus personagens.
Em Meyerowitz Stories, lançado esse ano diretamente para o Netflix, Baumbach retrata a relação complicada de três irmãos com o pai, um artista narcisista e prepotente com potencial nunca atingido, interpretado por Dustin Hoffman. É uma experiência inquietante observar como o rancor latente dos três filhos pelo pai transparece em cada troca de palavras ou desvio de olhares. Existe uma tensão constante gerada pela expectativa de quando e como o rancor de cada um dos filhos vai estourar de volta no pai (ou se será, como fora até aqui, ocultado num nível de consciência ainda mais profundo, gerando ainda mais amargura).

Baumbach procura revelar propositalmente o pior de cada um de seus personagens para tirar daí a potência dramática de sua história. Por isso, eles surgem com diversas imperfeições: egocentrismo, autoindulgência, instabilidade emocional, incapacidade de falar sobre os próprios sentimentos, etc. Cada nova falha de caráter é uma consequência traumática direta de uma infância infeliz, manifesta nesses personagens quarentões que ainda não foram capazes de superá-la.

Estruturado a partir de esquetes que contam linearmente a mesma história se desdobrando, mas com enfoque específico para cada personagem (bastante similar a Os Excêntricos Tanenbaums), Meyerowitz Stories apresenta sua narrativa com contornos bem sombrios, expressos pelo caráter dos personagens e de uma incapacidade iminente em se transformar. Porém, eventos catárticos no final indicam a quebra nesse círculo masoquista familiar, permitindo que a história termine, inclusive, com um tom bastante adocicado – o que poderia ser evitado, dependendo do gosto de cada espectador.

Há marcas evidentes de Baumbach por todo lugar. Sua boa capacidade para dirigir atores, seja extraindo ao máximo o seu potencial com um trabalho de direção dedicado ou construindo um personagem sob medida para alguém específico – como nos casos de Adam Sendler e Ben Stiller, que exibem aqui retratos aprofundados desses personagens errantes e fracassados (profissional ou pessoalmente). Outros nomes de peso incluem o sempre competente (embora as maiores glórias já estejam num passado bem remoto) Dustin Hoffman, a infalível Emma Thompson e Elizabeth Marvel, num trabalho surpreendente como uma das irmãs Meyerowitz.

Mas certamente a marca mais exuberante de Baumbach aqui é a capacidade que o diretor-roteirista possui de transitar entre o drama e a comédia com agilidade impressionante, muitas vezes entrelaçando os dois tons simultaneamente, tornando a experiência do filme mais acessível, sem comprometer o estudo de personagem. Essa marca perpassa o trabalho de Baumbach em seus melhores filmes, como A Lula e a Baleia ou Frances Ha, mas a exibição desse traço em Meyerowitz Stories deixa claro que estamos diante de um Baumbach em plena forma (quer goste-se dele ou não), nesse que talvez seja o seu melhor filme.

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