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Operação França

(French Connection, The, 1971)
8,1
Média
414 votos
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Críticas

Cineplayers

Um policial bem diferente do que Hollywood está acostumado a produzir, e também dos melhores.

8,0

Um dos melhores policiais urbanos que Hollywood já produziu, Operação França faturou nada mais nada menos do que cinco dos oito Oscar que disputou em 1972, inclusive filme e diretor. Serviu para impulsionar também a carreira de Hackman, em uma produção difícil, que quase não saiu do papel, por nenhum estúdio acreditar no projeto – alguns, inclusive, chegaram a recusá-lo duas vezes. Isso porque não era um filme tradicional que Hollywood estava acostumada a produzir, pois o mocinho não tinha nenhum receio de ser durão, mal educado e de utilizar da grosseria – no pior sentido da palavra – para conseguir o que quisesse, a história também não era tradicional, ou seja, poderia ser um tiro pela culatra de qualquer um. No mínimo irônico, não?

Mas o filme foi produzido e conquistou tudo o que já foi citado, inclusive o carinho e a identificação do público e da crítica. William Friedkin, o diretor mais jovem a ganhar um Oscar até hoje, conseguiu, graças a sua experiência em documentários, levar as telas de forma realista a história real da maior apreensão de heroína da história americana, realizada pelo durão Popeye (vivido por Hackman) e Cloudy (Roy Scheider). Seguidos pelo instinto de Popeye, a dupla contrariou a tudo e a todos na polícia para prosseguir com o caso e tudo isso é mostrado na tela, desde quando Popeye começa a desconfiar dos traficantes em uma hilária cena no bar até o desfecho psicológico dos personagens. Aliás, esse desenvolvimento é um grande trunfo do filme, já que o roteiro não prioriza somente a ação desenfreada, como nos filmes do gênero hoje em dia, e sim há um minucioso trabalho por trás dos sentimentos, pensamentos de cada um, que convidam você ainda mais a adentrar na interessante história que está sendo contada. Digamos que seja o tempero certo para o prato perfeito.

Somos apresentados a uma Nova York diferente da que estamos acostumados a ver, suja, melancólica, deteriorada. Quando os atores estavam sendo preparados, a dupla de policiais real (Popeye e Cloudy em carne e osso) os levaram para dar um ‘passeio’ por esse submundo desconhecido pela grande maioria. E foi um espanto quando se soube que, a cinco quarteirões apenas de onde um dos membros da equipe morava, havia um centro pesado de injeção de drogas. Eles visitaram o lugar, viram pessoas com seringas grudadas no braço, elásticos apertando os braços, cenas que nenhuma pessoa teria o prazer de ver. Mas lógico que essa preparação funcionou, pois os atores entraram no clima e a vontade acabar com aquilo tudo poderia ser perfeitamente transposta para a tela.

Hackman deslanchou como ator depois desse filme em uma interpretação convincente e que quase o selou ao personagem. Mais uma ironia do destino, já que o diretor simplesmente não o queria como seu protagonista (típico anti-herói). Inclusive chegou a brigar com ele durante a produção, por coisas simples. O estúdio citou grandes nomes para os personagens, como Paul Newman, mas o diretor achou que isso iria tirar o realismo de seu filme, o que até concordo, mas como solução chegou a cogitar usar os dois policiais reais para se auto-interpretarem na tela, o que é um pouco demais também (Friedkin tinha umas loucuras como essas, como a história do tiro que ele deu dentro do set de O Exorcista, por exemplo). A escolha de Hackman foi perfeita, pois o ator virou símbolo do filme, mesmo que não gostasse do papel no começo. Isso mesmo, ele era bonzinho demais para o seu personagem, que é racista e grosseiro a todo o tempo. Hackman, inclusive, não tinha a menor simpatia pelo Popeye real, mas com o tempo aprenderam a trabalhar juntos e todo o brilhantismo que vemos na tela funciona em uma química perfeita com Roy Scheider, o cérebro e balança para as ações da dupla.

O livro de Robin Moore foi fielmente transposto para a tela, mas com um diferencial que só o filme possui: a famosa cena de perseguição do carro ao trem suspenso pelas ruas da cidade. Essa cena foi incluída no filme porque Friedkin achou que eles deveriam fazer a melhor cena de perseguição já feita, com o objetivo de superar a de Bullit. Pegaram um carro, colocaram um motorista no banco da frente e um câmera no banco de trás e saíram correndo pelas ruas de NY a 140 por hora, gravando tudo o que acontecia. Com isso, todos os acidentes vistos na cena foram reais, a batida no ônibus, no paredão, no carro que cruzou a pista... Todas imprevistos, mas mesmo assim utilizadas no filme. Ainda bem que ninguém saiu ferido. A única parte forjada de toda a perseguição é o quase atropelamento ao carrinho de bebê. Essa cena, da perseguição, tornou-se extremamente clássica e inspirou diversos outros filmes e até alguns jogos, como os da série Driver, por exemplo.

O filme é também um soco no estômago de alguns conceitos, como uma das primeiras cenas de Hackman, que ele espanca um bandido vestido simplesmente de papai Noel. É um declarado foda-se ao espírito natalino, uma crítica justamente ao que os policiais deveriam estar defendendo. Há outras cenas pesadas, como o bandido comer um pedaço de pão do morto logo depois do assassinato. O filme inteiro é cheio dessas críticas minuciosas, que podem passar despercebidas pela maioria, principalmente pelo filme desprover de uma narração explicando o que está acontecendo. O filme vai pedir sua atenção para os fatos, principalmente na parte final, na genial cena do tiro.

Ah, há mais uma cena de um tiro que eu gostaria de comentar, pois causou uma certa revolta por parte dos policiais reais. Em um certo momento fictício, criado para o filme, Popeye atira pelas costas em um dos bandidos. Obviamente isso revoltou os policiais reais, que acharam que a reação do público seria ruim, uma vez que poderia ser considerado uma covardia. Mas, quando na exibição teste, para cerca de 1.000 pessoas, elas comemoraram muito no momento do tiro, Friedkin provou para os dois que estava certo ao incluir a cena na versão final do filme (ainda mais com toda a personalidade apresentada no filme dos protagonistas).

Pela coragem, Operação França conseguiu uma proeza (mesmo que eu não ache justo) de bater ninguém menos que Laranja Mecânica no Oscar daquele ano. É um excelente filme, com ação na medida certa, recheado de cenas clássicas que você já viu plagiadas em algum canto com certeza. É uma obra prima da ação policial urbana. Pede a sua atenção, não subestimando ninguém com uma narração mastigada que tiraria o gostinho de interpretação de diversas cenas. Hoje em dia Popeye já não está entre nós, vítima de um câncer em 1995, mas Cloudy dá diversas entrevistas para o DVD (duas horas de extras na edição dupla, imperdível) e é, inclusive, produtor de um dos documentários. Uma pena que Friedkin, esse figurão, só tenha acertado a mão duas vezes, uma com Operação França e outra com O Exorcista, pois esse seu jeito bem louco de fazer cinema virou um marco. Olha que ele jura de pés junto que nunca teve saco para ler o livro. É um filmaço que não deve ser deixado de lado.

Comentários (2)

Bruno Kühl | segunda-feira, 30 de Janeiro de 2012 - 13:52

A crítica está ótima, mas...
"Uma pena que Friedkin, esse figurão, só tenha acertado a mão duas vezes, uma com Operação França e outra com O Exorcista, pois esse seu jeito bem louco de fazer cinema virou um marco." WHAT?! ARE YOU FUCKIN' CRAZY?

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