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Críticas

Cineplayers

Um arremedo de tudo.

3,0
Em 2012, o artista espanhol Víctor Santos começou a publicar a série em quadrinhos virtual Polar: Came From The Cold (Polar: Vindo do Frio), histórias noir altamente estilizadas e sem nenhum diálogo. Com o sucesso, a editora de quadrinhos Dark Horse Comics passou a publicar as mesmas histórias com diálogos adicionados e direitos de adaptação foram comprados já em 2014. Em 2017, foi anunciado que Mads Mikkelsen (007: Cassino Royale e Hannibal) seria a estrela principal do filme. 

Com a Netflix juntando-se à produção para distribuir o filme, foi escalado o sueco Jonas Åkerlund na direção. O nome pode não soar familiar no meio cinematográfico, mas o diretor tem vasta experiência no meio musical, onde está na ativa desde 1988, tendo dirigido clipes para Madonna, Lady Gaga, Christina Aguilera, Metallica, Rolling Stones, U2, Maroon 5 e outros.

Tal gama de artistas indicam um verdadeiro ecletismo por parte de Åkerlund, e de certa forma Polar lembra bastante seu clipe para Telephone, da Lady Gaga, na tentativa de flertar com gêneros. A temática da história, sobre o experiente assassino Kaiser Negro que perto da aposentadoria passa a ser caçado pelos antigos patrões, chega a lembrar a franquia John Wick, estrelada por Keanu Reeves (Matrix).

O maior problema do filme, porém, é que ele é um verdadeiro caos narrativo e estilístico. Se pensarmos em outros diretores que usam da construção referencial, como Quentin Tarantino em Kill Bill e Takashi Miike em Apocalipse Yakuza, falta o cinismo autoconsciente que permitia os filmes serem costurados narrativamente de maneira minimamente interessante. Não é o caso aqui, já que uma trama mais séria (a relação entre o assassino aposentado e uma jovem vizinha tímida, vivida por Vanessa Hudgens, de High School Musical) compartilha espaço com uma trama bizarra de humor negro (os mercenários que buscam pelo personagem principal). 

E ao contrário de outros filmes que mesclam diferentes formatações de gênero, Polar falha nas duas frentes. Quando tenta ser sério, os diálogos são piegas e artificiais na forma mais rasteira do melodrama, onde a câmera também para de inventar e investe apenas nos closes de quem está falando. Quando tenta ser bem-humorado, também não tem muito sucesso na empreitada por basicamente repetir ideias supostamente engraçadas (personagens que não morrem imediatamente com tiros por conta de suas características, como vício em drogas ou obesidade mórbida) sem que elas tenham qualquer evolução de causalidade, sendo basicamente esquetes sem assumir o formato e que atrasam a narrativa em dezenas de minutos.

Åkerlund mescla ausência e excesso de cores; montagem videoclipada e cortes burocráticos; um excesso de gore digital para distrair uma completa falta de verossimilhança: o personagem principal, apenas um humano “normal”, consegue desaparecer e reaparecer em questão de segundos, mas não é tão “super” assim posteriormente, apanhando e sendo torturado. Se formos comparar com John Wick, por exemplo, com o personagem sendo cuidadosamente construído, jamais pareceu estranho quando o personagem de Keanu Reeves realizava feitos absurdos ou sobrevivia a enormes traumas físicos, pois a produção dedicava grande parte a construir tanto o mito quanto o lado mais humano.

Aqui, por outro lado, temos apenas o estilo pelo estilo; um amontoado sem substância nenhuma. Um filme estilisticamente afetado, sobretudo, com poucas boas ideias. Uma delas, mostrar uma trupe de mercenários desistir depois de ter mais de dois terços de seu contingente massacrado por um único indivíduo, é uma das poucas novidades contendo alguma verossimilhança “realista”, mas que ironicamente não casa com um roteiro que parece ter saído do roteiro dos piores quadrinhos, onde o que importa é que o feito incrível seja o mesmo, embasado com coerência ou não.

Não são poucos os motivos para acreditar que Jonas Åkerlund deveria ter permanecido nos clipes, onde suas brincadeiras se sustentam entre três e dez minutos. Mas ao darem duas horas para o diretor, o resultado é um dos filmes mais cansativos de se assistir nesse início de ano.

Comentários (1)

Robson Oliveira | quinta-feira, 07 de Fevereiro de 2019 - 20:26

não achei tão cansativo assim, apesar de concordar que "Quando tenta ser sério, os diálogos são piegas e artificiais na forma mais rasteira do melodrama", realmente é ruim de roteiro, mas as cenas de ação são até legais, já vi piores!

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