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Críticas

Cineplayers

No picadeiro da Lava Jato, somos todos palhaços.

2,5
Não se pode dizer que falte ambição a Marcelo Antunez, o diretor desse Polícia Federal: A Lei é Para Todos - Os Bastidores da Operação Lava Jato (ufa!), pela ascensão que imaginou pra si em meio a sua carreira despretensiosa, mas talvez uma das coisas mais curiosas a se observar em 2017 tenha sido o combo que o une a Rodrigo Bittencourt, e seus respectivos projetos. Diretores de comédias sem quaisquer predicados, ambos tiveram a dose certa de coragem, elevada auto estima e cara de pau para sair de suas zonas de conforto e dirigir dois retratos da história recente do país. Em ambos os casos, dado o retrospecto de seus autores e considerando as arriscadas abordagens de seus temas, as chances de dar errado eram grandes; em ambos os casos deu. Mas a verdade é que talvez o pé no chão de Antunez o tenha livrado de uma vergonha maior; ok, ainda é bem vergonhoso, mas minimamente consciente ele parece ter sido. E no fim das contas se a polarização política atual do país o faz ainda mais irresponsável, é verdade que também não é necessário entrar nesse caráter para percebermos a mediocridade. 

Marcelo Antunez ainda não tinha assinado um longa que seja sozinho, e todos os três anteriores tinham o mesmo nome ao seu lado, o Midas brasileiro Roberto Santucci. E foi assim que as 'gemas' Até que a Sorte nos Separe 3, Qualquer Gato Vira-Lata 2 e Um Suburbano Sortudo viram a luz do dia, e com os três Antunez encheu os bolsos. Provavelmente um diretor contratado aqui, nosso herói chegou à cadeira de diretor finalmente sozinho e almejando possivelmente um lugar de destaque como diretor desse misto de thriller investigativo e biografia histórica, jogando os dois gêneros num mar de lugares comuns e clichês, que ao menos é tratado com pouca firula modernos e uma pegada mais direta. Se em sua primeira hora ao menos não temos vontade de xingá-lo, com seu trabalho burocrático porém correto, não é feito nada além do que já vimos tantas vezes em qualquer cinema, ainda que o roteiro desde o início dê defeito. 

De montagem até interessante, o filme abre e caminha bem por uns 40/50 minutos, quando acompanhamos toda a sequência que precede o momento da fuga de Alberto Yussef. Então voltamos um pouco no tempo, para entender como todos aqueles personagens foram parar ali, aquela equipe tarefa da polícia federal que se une pra fazer uma faxina nos arquivos da unidade central do país. Todos as quatro figuras centrais (os delegados vividos por Bruce Gomlevsky, Flávia Alessandra, João Baldasserini e o líder do grupo, vivido por Antônio Calloni) se conheciam de outros carnavais e só aceitam os novos cargos por saberem trabalhar juntos. E no meio da faxina da qual o personagem de Gomlevsky se encarrega, um esquema entre doleiros vem à tona e com o rastilho de pólvora achado, eles vão cavando cada vez mais até dar onde deu. Como já dito, há ritmo, há cenas de perseguição até interessantes e bem realizadinhas, e há um esforço do elenco em tentar deixar tudo crível.

O filme não tenta esconder de onde vem sua principal inspiração, o vencedor do Oscar 'Spotlight', sobre o grupo de jornalistas investigativos que levantaram um esquema de pedofilia encoberta pela Igreja Católica. Só que os roteiristas Thomas Stavros e Gustavo Lipztein não são Tom McCarthy e Josh Singer, logo não há qualquer resquício de humanidade ou tentativa de uma leitura mais profunda daqueles personagens, todos unidimensionais e rasos, tratados como super herois ou caricatos vilões. Vejam a figura de Sérgio Moro, reduzida no filme a um homem que olha preocupado para o horizonte por 5 segundos a cada decisão que precisa ser tomada, enquanto desempenha com categoria suas funções de marido e pai. Ou o delegado vivido por Calloni, claramente um decalque do personagem de Michael Keaton no longa americano, mas que não tem qualquer conflito ou verve diferenciada. Ainda assim é uma dádiva ter um ator imenso como ele dando um resquício de brilho ao todo.

Como citei acima, "mocinhos e vilões" são tratado com maniqueísmo absoluto, e quem são os vilões de Marcelo Antunez, vilões esses cuja construção caricata de roteiro destroi a pouca credibilidade do roteiro? Todos que são investigados e eventualmente presos. De um sarcástico porém trágico Yussef (o melhor desenho de personagem do filme de longe), passando por um Marcelo Odebrecht simplesmente estupefato vivido por Leonardo Medeiros com igual estupefação (de fato não consigo compreender as linhas de raciocínio que foram empregadas aqui) e pelo Paulo Roberto Moraes de Roney Facchini com feições de um malfeitor da Disney até chegar no mais óbvio, claro, o mandante de todo o mal, o príncipe das trevas, o tinhoso encarnado, o homem que come criancinhas no jantar Luis Inácio Lula da Silva. Retratado como um sujeito arrogante e antipático, nos resta lamentar os artifícios que o filme usa para transformar o ex-presidente no discípulo de Voldemort, que encontra o máximo de irresponsabilidade pública aqui. Não tem o que falar sobre Ary Fontoura quando o mesmo nada fez. Absolutamente nada. Manipulação de plateia, sr. Antunez?

Não tem como encerrar esse texto sem jogar luz nas duas performances do filme que arrebatam olhares, para o bem e para o mal. Nenhuma delas reabilita todo o desserviço que um filme como esse faz, sendo lançado no período que está sendo lançado, com a história tratada como é tratada aqui, independente de qualquer posicionamento político e completamente sem isenção. Mas acho que esses dois atores imprimem sem querer uma sutil compreensão dos fatos. O Yussef de Roberto Birindelli é um clown trágico por excelência, um homem que começa o filme na marcha do desespero, olhos de fogo prestes a desertar, o primeiro rato a pular do barco mas também o primeiro a ser pego; com a prisão, está armado o grande picadeiro onde Birindelli se refastela, em passagens rápidas que definem um homem nos estertores do medo, quando o seu depoimento coroa essa atuação brava em meio caos. Caos? Teu nome é Bruce Gomlevsky. Sem perder muito tempo e da forma mais sutil possível, direi que nenhum espectador esquecerá 'Polícia Federal' e a culpa é de Gomlevsky, que da sua primeira a última cena não consegue dar uma única fala com naturalidade. Cria do teatro, premiado como ator e como diretor nos palcos, o Gomlevsky visto aqui é inesquecível, pelos mais terríveis motivos. Não é irônico exatamente esse filme ter exatamente essas duas performances exatamente nesses dois personagens tão opostos em antagonismo o lugar de lembrança dele?

Comentários (9)

Jules F. Melo Borges | segunda-feira, 11 de Setembro de 2017 - 05:41

A bilheteria parece que não foi bem...
Parece que o fuzuê não foi o bastante pra atrair o público (A cara de novelão também não).
Cinema comercial nacional precisa aprender a ser menos didádito e mais sem-vergonha, investir no tiroteio e ultrajar o público. Esse filme dava um bom 'poliziottesco' à brasileira. Imagina a confusão. 😏

Mateus da Silva Frota | domingo, 28 de Janeiro de 2018 - 21:49

"o mandante de todo o mal, o príncipe das trevas, o tinhoso encarnado, o homem que come criancinhas no jantar Luis Inácio Lula da Silva" 😏😏😏

Alan Nina | terça-feira, 25 de Junho de 2019 - 10:16

Filme lixo, inclusive a história já o soterrou

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