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Críticas

Cineplayers

O novo piloto automático de Meryl Streep simplesmente não decola.

3,5

Jonathan Demme surgiu do cinema para onde eventualmente tenta voltar, o indie/underground. Óbvio que tudo mudou depois que um certo Hannibal Lecter surgiu em sua vida, dando um dos 5 carecas dourados de O Silêncio dos Inocentes. Quase 25 anos depois, nós (talvez ele também) temos a plena consciência de que aquele foi o ápice de sua carreira, nunca mais nem vislumbrado. Repleto de erros monumentais após, como O Segredo de Charlie e Bem Amada, há 7 anos ele lançava O Casamento de Rachel e o caminho parecia estar iluminando outra vez, de leve. Novos documentários e esse "novo produto para a indicação anual de Meryl Streep" depois, e Demme chega cada vez mais perto de provar que a adaptação do best-seller de Thomas Harris foi uma exceção em sua carreira.

Esse filme de nada difere nas intenções em comparação a Simplesmente Complicado e Um Divã para Dois, dois recentes sucessos da maior indicada ao Oscar  da história. Se algo os separa é que esse aqui não fez sucesso algum de bilheteria; os une o fato de que Meryl não terá qualquer chance de ser lembrada nas indicações de janeiro próximo, num misto de não ter nada relevante para fazer em cena e passar vergonha com um desenho de personagem bem equivocado. Mas vejam a que ponto Jonathan Demme chegou, seu filme é um veículo para a diversão anual de Meryl Streep!

Só que nós mesmos já não nos divertimos mais, e nem nos emocionamos mais. A situação criada em cena é das mais clichês e esquemáticas possível, com uma mãe que abandonou marido e três filhos para virar estrela do rock. Anos depois, tem uma filha suicida, um filho travado e outro gay, tudo isso esclarecido numa constrangedora cena de jantar em família onde cada um fala frases feitas tiradas de manual parecendo bonecos de ventríloquo, enquanto Meryl ergue as pernas com figurino óbvio e se senta como uma adolescente rebelde dentro de um restaurante elegante. Patético.

Demme nem tenta esconder porque aceitou o convite para a empreitada: todas as cenas dos shows de Ricky Rendazzo e sua banda são filmadas da mais eficiente forma possível, ao menos uma em plano sequência. Durante essas sequências (elas são muitas, pelo menos 10) vemos a naturalidade e o despojamento que todo o resto do filme gostaria de ter, mas que nem faz ideia de como alcançar. Ainda que pareçam rápidas, rasteiras e deslocadas, as cenas de dramaturgia do filme precisam do cuidado que somente é dedicado ao outro 50% do filme, e o insosso roteiro de Diablo Cody não melhora em nada a situação, com poucos diálogos realmente bons e fechando os personagens em questões ruins e soluções ruins, personagens esses como já se disse, estereotipados e chapados, só vistos por um lado.

Ao elenco resta encenar o todo e a maioria não tem muito a fazer, talentos como Kevin Kline e Audra McDonald (como conseguiram tirar essa mulher da Broadway e dar NADA para ela fazer???) entram e saem incólumes de cena, e do trio de filhos só se destaca mesmo 'a filha da mãe' Mamie Gummer, cada vez mais interessada e interessante como atriz, não fazendo feio nos embates com sua progenitora embora a mesma não esteja de fato se esforçando para além da composição de figurino. É basicamente isso: Meryl mais uma vez fazendo tudo tão com o pé nas costas que vez por outra ou cai ou deixa os tornozelos expostos. Como Demme, só no palco ela parece liberta e a vontade, espontânea e viva, mesmo que isso seja pouco para um filme que não é a radiografia da turnê de uma banda decadente de barzinho. Não é, mas pelo visto seria melhor se fosse.

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