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Tempos Modernos

(Modern Times, 1936)
8,9
Média
1058 votos
?
Sua nota

Críticas

Cineplayers

Charles Chaplin em seu mais contundente objeto de análise e crítica social.

9,0

É difícil falar sobre Charles Chaplin sem parecer repetitivo ou redundante. Todos conhecemos sua sensibilidade por trás das câmeras e diante delas. Todos conhecemos seu talento para fazer rir através das mais simples imagens. Todos conhecemos sua visão bastante peculiar de sua época, fortemente retratada em muitos de seus curtas e filmes. Todos sabemos do forte desprezo que Chaplin sentia pela chegada definitiva do som ao cinema. E todos conhecemos Carlitos, sua figura mais marcante e que viria a ratificar o rosto de Chaplin nas telas. E todos conhecemos Tempos Modernos, último filme onde seu personagem mais icônico aparece, e também seu primeiro projeto onde o som é finalmente utilizado.

E Tempos Modernos talvez seja a obra mais atemporal de Chaplin enquanto critico social e analista não apenas de seu tempo, mas do próprio ser humano enquanto parte de uma comunidade. Mestre na arte de lapidar suas mensagens ácidas e pertinentes em meio ao humor pastelão e aparentemente ingênuo, Tempos Modernos é um retrato agridoce e incômodo sobre a crise desencadeada pela Grande Depressão, e na busca da sociedade em se recuperar e se adequar a uma realidade que pouco favorece os que estão embaixo. Em sua última aparição no cinema, Carlitos é um operário que trabalha intensamente, porém de onde acaba sendo demitido, tendo que enfrentar diversas adversidades quando jogado no olho da rua, entre elas ser confundido num protesto comunista e acabar caindo atrás das grades da prisão.

Um dos principais pontos de Chaplin na hora de fazer a plateia rir estava justamente em inserir seu personagem em meio a situações cotidianas e corriqueiras e transformá-las numa bola de neve, onde cada ato de ingenuidade do Vagabundo o levava a situações cada vez mais inesperadas. Não apenas isso, Chaplin era um mestre nas gags visuais, sempre simples e econômicas, mas absurdamente criativas. E era em meio a elas que o diretor inseria suas críticas ácidas ao modo de vida do ser humano, aqui retratado como uma vítima constante de um sistema alienado e desumano, onde o capitalismo tornava os trabalhadores em frias máquinas de produção. E, neste caso, Chaplin não poderia ter sido mais feliz na ironia de seu título, onde os tempos modernos e o contínuo avanço da tecnologia inutilizam o papel do homem em meio ao funcionamento da sociedade e seu real objetivo dentro dela.

Nesse caso, o próprio uso do som se torna mais uma arma para Chaplin promover seu debate, ao mesmo tempo em que não deixa de ironiza-la. Percebam que o som somente surge em momentos-chave, onde o mesmo assume a posição de veículo de repreensão. Nos minutos iniciais na fábrica, por exemplo, escutamos a voz do chefe ecoar pelas paredes, enquanto que seus operários, em ritmo constante de trabalho, falam mas não possuem voz. O som também está nas batidas dos pregos, nas engrenagens das máquinas... É o homem preso em meio ao som de sua caixa rotineira e completamente privado de seus direitos enquanto seres humanos. Mas Chaplin estava longe de ser completamente negativista em relação ao avanço que acontecia ao seu redor e faz um belíssimo uso do som nos momentos finais do filme, onde finalmente ouvimos a voz de Carlitos, indicando que o som também poderia vir a ser um importante aliado na tradução do poder de uma imagem.

Chaplin também romantiza sua obra ao inserir um envolvimento, romântico ou não, com Gamin (Paulette Godard), uma moradora de rua que não se deixa levar por sua situação degradante e que se recusa a passar fome. Belíssimo é o momento onde ela e Carlitos sonham com uma vida frutífera, feliz e despreocupada, em outra clara ironização da situação econômica do país e das poucas oportunidades concedidas aos que se encontram na lama, mas que mesmo em meio a uma casa caindo aos pedaços, conseguem encontrar um no outro uma razão para sorrirem. É lindo e poético.

Chaplin encerra seu filme e se despede de Carlitos num grandioso take onde avistamos o horizonte, para onde Carlitos e Gamin caminham, incertos em relação ao seu futuro, mas decidimos levar a vida adiante, seja ela como for, desde que estejam ao lado um do outro. É um desfecho otimista com um bom quê de pessimismo, mas que reforça a mensagem dupla de Chaplin em relação ao lado positivo e ao lado negativo de nossas convivências enquanto sociedade. E quase 70 anos depois, não é que nossa realidade segue praticamente a mesma?

Isso é Charles Chaplin e seu cinema que permanece intacto até hoje.

Comentários (9)

Marcos Freitas | sexta-feira, 19 de Junho de 2015 - 17:32

Clássico absoluto do mestre Charles Chaplin!!! com uma análise profunda e reflexiva de nossa sociedade.

Fabiano Chinaski | sábado, 20 de Junho de 2015 - 02:44

Linda análise do filme! 😁 Apenas duas pequenas correçõezinhas: no 4 ° paragrafo - "Percebam que o som somente em surge em momentos-chave" e no penúltimo: "mas decidimos a levar a vida adiante".

Rodrigo Cunha | segunda-feira, 22 de Junho de 2015 - 01:12

Ajeitei. :)

A gente lê e relê, mas sempre passa alguma coisa, haha. Vlw!

Rodrigo Carlos de Souza | segunda-feira, 22 de Fevereiro de 2016 - 14:38

Filme excelente, porém não gostei da relação do personagem de Chaplin com a garota Gamin, ela vê ele como um pai, mas tenho a impressão que ele a vê como mulher, e por ela ser menor isso me desagradou bastante...mesmo assim nota 9.0

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