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Críticas

Cineplayers

Produto enlatado para festivais de cinema e fãs de filmes alternativos.

3,0

O cinema independente está em crise. Este Tony Manero, por exemplo, cultuada obra chilena de calorosa recepção em festivais mundo a fora, é um filme mais próximo de X-Men Origens: Wolverine e outras anomalias enlatadas holywoodianas do que sua temática pode insinuar – problema que não atinge somente a este filme em específico, mas grande parte da produção alternativa contemporânea. Não há nada em comum entre uma história de super-heróis mutantes e a de um homem miserável que encontra em um ícone pop uma espécie de fuga para sua realidade, mas ambos os produtos (e este é sim o termo correto, um produto) são desenvolvidos sob uma mesma linha de fabricação, o que por fim acaba gerando resultado semelhante.

Se no filme da franquia X-Men Gavin Hood segue a risca a fórmula de filme de ação para adolescentes, tão criticada pelos cults e alternativos, Pablo Larrain, antes de filmar Tony Manero, provavelmente decorou em duas línguas a cartilha Como Fazer Sucesso em Festivais de Cinema e Blogs Pseudo-Intelectuais. Seu filme é minado por elementos que cada dia mais parecem ter de aparecer obrigatoriamente em filmes de encomenda para festivais, elementos que, desde a popularização e a expansão do modelo de cinema construído no Festival de Sundance, o principal do cinema independente norte-americano, têm se tornado base de estética e narrativa da maior parte das produções alternativas.

As intenções são realmente as melhores, e em alguns momentos, por debaixo de todo aquele furacão de tiques, câmeras suspensas, abstrações focais, movimentos de câmera embriagados e cortes bizarros cicatrizados por elipses, encontramos uma pequena ponta de verdade e de vontade de construir um real discurso acerca do universo em questão. Larrain faz da ascensão maquiavélica de um fracassado em busca de seu sonho de poder uma metáfora para as ditaduras latinas do século XX, e sua habilidade em ocultar as observações políticas detrás da história em questão - sem que, para tanto, fosse necessário interrompê-la, como por exemplo faz Soderbergh em seu Confissões de uma Garota de Programa – dão ao filme uma importante fluência e o mérito de construir associações pertinentes sobre a época em que é ambientado – o Chile durante a ditadura de Pinochet – através de camadas ocultas de suas ações e cenários.

Em contrapartida, a superfície atrás da qual escondem-se estes méritos não passa de um embuste besta e ultrajante. Larrain esquece-se da moral e do respeito ao intelecto alheio e faz da própria manipulação maquiavélica a chave para formatação de seu discurso, transformando-se em presa fácil da própria armadilha. O diretor não poupa truques e fórmulas para vender este cenário miserável pelo qual se aventura, apostando sempre no choque estético, através da sujeira da imagem e da iluminação de “boca de fumo”, e na capacidade de os embates morais que suscitam da situação resultarem em questionamentos éticos acerca deles, batendo insistentemente na mesma tecla a ponto de perder uma hora sem que sequer um novo elemento fosse incorporado ao filme.

O resultado final é um prato fino para o público médio de festivais, e isto explica o sucesso que tem feito neles. Larrain busca insistentemente apresentar a miséria física e moral da sociedade em meio as ditaduras através de um filme tendencioso e escuro física e moralmente, mas esquece que, para tanto, não basta colocar o espectador diante de uma experiência semelhante. Minha expressão ao término do filme era precisamente a mesma de Raúl Peralta ao sentar no ônibus após perder o concurso de sósias de Tony Manero: um idiota estagnado a contemplar a miséria – no caso dele, a social; no meu, a cinematográfica.

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