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Críticas

Cineplayers

A estréia oficial de Tropa de Elite nos traz um dos melhores filmes do ano!

9,0

Tropa de Elite já era um sucesso antes mesmo de estrear nos cinemas brasileiros. Fenômeno (e vítima) da triste realidade da pirataria no país, o filme era comentado por todos, sem exceção, inclusive em meio aos próprios policiais, muito antes do seu lançamento oficial. Fico feliz em dizer que, ao contrário de muitos, consegui resistir à tentação e esperei a estréia do filme nos cinemas cariocas e posso dizer, com a mais absoluta felicidade, de que todo esse fuxico ao redor do novo longa de José Padilha (o mesmo do também maravilhoso Ônibus 174) tem realmente fundamento. O filme é maravilhoso.

Mostrando com uma profunda precisão a realidade da polícia carioca, conhecemos a história do Capitão Nascimento (Wagner Moura), membro do eficiente BOPE, esquadrão que entra em ação quando a PM não é suficiente para controlar o caos do Rio de Janeiro. Ele é selecionado para participar da operação que combate as drogas no morro do Turano, pouco antes da visita do Papa, que pretende dormir perto do local, ao mesmo tempo em que vive um conflito familiar; sua mulher o pressiona a achar um substituto, visto que ela está grávida e as missões do Capitão são sempre de alto risco.

O filme é altamente realista, desde o roteiro (baseado em fatos reais) até a atuação dos atores, passando por belas escolhas de locações e figurinos. As operações convencem, assim como suas execuções e resultados. Afinal, sempre há uma motivação e uma conseqüência, e um dos méritos do filme é não pular as entrelinhas entre um ponto e outro. O filme caminha com calma, explicativo. Começa em um dos clímax, voltando no tempo e, quando retorna ao ponto em que parou, vemos que aquilo era apenas um aperitivo do que viria pela frente, dividindo o filme em duas partes distintas.

José Padilha vem demonstrando uma forte tendência a retratar os problemas na polícia do Rio de Janeiro, já que seu filme anterior, Ônibus 174, contém diversas críticas a nossa força de defesa. Porém, em ambos os filmes, ele coloca tudo de um jeito em que realmente percebemos que, muito além de apenas criticar, ele quer nos mostrar onde está o erro e tentar ajudar, da sua maneira, a consertar. Uma prova disso é que ele sempre retrata o lado bom e ruim da polícia, guardando as devidas proporções reais de como acontece.

Aliás, todo o conteúdo é extremamente crítico. Padilha faz com que realizar um filme crítico pareça fácil de se filmar, mas todos sabemos que não é bem assim. Ele liga muito bem os pontos, media bem com as passagens de ação, que fazem o filme ficar mais pregado aos que gostam de um tiroteiozinho para prender sua atenção - o tal blockbuster americano, o espetáculo.

Muitos adoraram a crítica do diretor com relação à participação dos jovens de classe média alta no tráfico, mas é uma ironia pensar que, quem comprou o DVD pirata, está fazendo praticamente o mesmo com o cinema nacional. Adoro a cena de Matias esmurrando o jovem em meio à passeata da paz. Mas esse é um dos erros do filme também. Ao mesmo tempo em que acerta ao mostrar os dois lados da polícia, erra ao generalizar os jovens sendo todos imbecis e maconheiros. Sei que existem muitos assim, hipócritas, mas tomo por exemplo eu mesmo, que nunca fui desse tipo. Ali também poderia ter os dois lados da moeda.

Wagner Moura vem se mostrando como um dos mais promissores atores que o Brasil produziu nos últimos anos. Distinguindo bem TV de cinema, o ator cria um Capitão preciso e extremamente eficiente, diferindo totalmente do Olavo que representou recentemente na novela das oito. Seria muito fácil confundir os dois, afinal, ambos são personagens fortes e cheios de características. Wagner é competente o suficiente para diferenciá-los nos detalhes. Espero que continue escolhendo os trabalhos certos e foque sua carreira no cinema, assim como Selton Mello e Rodrigo Santoro.

No elenco, destaco ainda as atuações de Caio Junqueira (Neto) e André Ramiro (Matias). Valorizo muito o trabalho dos rapazes porque eles conseguiram uma difícil tarefa que o roteiro exigia deles: o antes e depois do BOPE. Com suas motivações traçadas perfeitamente, acompanhamos seus crescimentos dentro da polícia e a evolução física que os atores passam depois de sofrerem o terror ao vivo. A montagem é fabulosa e brinca com a edição de uma maneira espetacular. Essa passagem de tempo do treinamento para a realidade é incrível, fluida e funcional. Deve-se destacar a coragem também de começar com uma cena, voltar para explicá-la e depois seguir em frente, tomando um rumo bem diferente da primeira metade do longa.

Há ainda o fato de muitos reclamarem de ser “mais um filme de favela”. Eu vejo esses “filmes de favela” quase que como um gênero nosso, assim como os faroestes ou os musicais norte-americanos. Temos muitas histórias para serem contadas de favelas, e se todas tiverem a qualidade de Tropa de Elite, estaremos com um farto acervo por muitos e muitos anos. Afinal, essa é a nossa realidade.

Texto retroativo da série Clássicos Brasileiros

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