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Vivir Ilesos

(Vivir Ilesos, 2019)
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Críticas

Cineplayers

Os paralelos de uma saga amoral

5,0

Um casal de pequenos vigaristas é capturado em uma armação fajuta que dá errado, e a partir desse evento o longa de Manuel Siles pouco a pouco explora um comentário social que vai explodir na narrativa depois das peças do jogo serem apresentadas. A princípio um filme de golpe mal sucedido em clima rocambolesco, onde os eventos se sucedem sempre a se sobrepor e anular os anteriores, o longa acompanha um espelhamento crítico entre classes sociais distintas, ainda que unidas pelos mesmos valores, apenas desenvolvidos de maneiras distintas. De protagonistas golpistas espertalhões a vítimas do poder instituído, um terceiro tipo de armadura perversa e desconhecida redefine o jogo tradicional.

Essa associação entre os homens pelo roteiro criam um interessante quadro de observação da sociedade. Ao questionar o que os leva a costurar seus propósitos na vida e comparar dois sujeitos que vivem à margem da moralidade, o roteiro promove um olhar sem julgamentos para ambos e os coloca em paralelo às suas ações, que tanto se definem como ao mesmo tempo também os enevoa. Enquanto a classe dominada segue tentando se livrar do destino inescapável e reconstruir, a dominante simplesmente joga com as possibilidades infindáveis que ela tem. De acordo com o filme, esse microcosmos não está apartado um do outro por serem todos produtos do mesmo meio, por isso suas questões são idênticas, sendo apenas respondidas de maneira diferente.

A realidade de Lucia e Alberto é esclarecida até certo ponto, com inúmeros pontos obscuros mantidos assim para rivalizar com a apresentação do sequestrador sem nome, que não apenas separa o casal como o condena. São três personagens sem 'ackground exploratório, que apenas seguem uma estrutura farsesca estabelecida desde o início por conflitos artificiais e interpretações carregadas de dramaticidade excessiva - o reencontro com a Magaly Solier de A Teta Assustada revela uma atriz de recursos ainda mais amplos, que trazem dados realistas a um filme que prefere acessar o realismo através do artifício, ainda que um personagem ligado a lei sabote o equilíbrio da produção, negativamente.

Mesmo que tecnicamente haja uma proposta falsa desde suas sequências iniciais, a montagem precária não assim o é pelas elipses propositais ou pelo jogo cênico anti-naturalista, mas pela absoluta ausência de ritmo e pelo encadeamento precário ao desenvolver o roteiro. Outra precariedade do projeto são a infinidade de pistas falsas ou de informações desnecessárias lançadas no vento, como criar uma subtrama dramático-familiar para um personagem que nunca tinha sequer pronunciado uma frase até então, e que literalmente não chega a lugar nenhum. Ainda dentro dessa ausência se encontram uma investigação policial das mais mal sucedidas, os diálogos que só parecem encontrar estofo no núcleo do cativeiro, entre outros personagens e cenas que falham em desenvolver interesse ou importância à narrativa.

Com um desfecho acertado em seu lugar ambíguo e pouco revelador daquele trio de personagens seguindo o quadro de (im)possibilidades já definido pela produção, Vivir Ilesos não consegue manter um equilíbrio entre erros e acertos de seus roteiro e direção. Ainda que não consiga equalizar suas pulsões a contento e deixe um quadro promissor perder terreno frente a falta de convicção entre provocar e contar sua história de maneira regular, o filme causa estranheza o suficiente pelo seu caminho errático e pela ingenuidade com a qual trabalha um possível arrojo estético que nunca se evidencia, a ponto de nunca parecer uma perda de tempo.

Crítica da cobertura da 43ª Mostra de São Paulo

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