Era uma vez o Rio de Janeiro, ano de 1997, uma história em que a polícia militar tem corrupção no DNA, o bandido é bandido, a classe média financia o tráfico, os favelados dão sua contribuição para o filme e a tropa de elite faz jus à bala, é impossível achar o lado bom.
A história é a seguinte: o Capitão Nascimento, líder do BOPE (Batalhão de Operações Policiais Especiais), trabalha na cidade carioca realizando missões com seus comandados. Missões de altíssimo risco, com confrontos diretos a traficantes em condições de guerrilha urbana. Nascimento exerce o cargo há dez anos e quer deixá-lo pois será pai e não suporta mais a pressão que o trabalho lhe traz. Mas para isso precisa de encontrar um substituto à altura. E o filme se baseia na formação desse novo guerreiro.
Bandido bom é bandido assassinado? Tortura faz parte do combate? E isso, é visão fascista? É uma grande ingenuidade pensar que a visão do personagem principal e narrador é a visão do diretor. A justiça instantânea que prática é natural como beber água, para ele, é claro, que se julga acima da lei. Entretanto, o filme não nos traz uma aprovação implícita dessa justiça realizada pelos intocáveis do BOPE. "Tropa de Elite" conta a vida de soldados que lembram o Rambo, é tiro e palavrão o tempo todo, mas de uma maneira que torna o longa complexo e deixa, após o cessar do tiroteio, um resíduo de reflexão no espectador. Todos os personagens são bem elaborados, há amostras reias de que o retrato tem fundo de verdade e a verdade dói.
Os personagens são bem elaborados, mas infelizmente o filme peca por não se aprofundar no perfil dos bandidos. Nisso, o filme foi muito superficial ao tratar os marginais como aqueles seres que morrem quando levam tiros. Há uma outra denúncia ousada, especialmente quanto aos oficiais da Polícia Militar: eles são vistos como uma cambada de corruptos bufões. O capitão Fábio causa risos com suas trapalhadas e rolos intermináveis. A juventude classe média é retratada como hedonista e ingênua; inocentes que discutem filosofia da Justiça enquanto puxam um baseado, simplesmente cômico. Já os moradores da favela aparecem como manipulados por traficantes e pelo poder público. O filme vai muito bem com seu jeito sumário de demonstrar as classes sociais.
"Tropa de Elite" mostra soldados de elite em um contexto nada cavalheiresco. Corajosos, durões, altamente habilidosos e treinados, suas sólidas convicções, suas dedicações inquestionáveis que os fazem correr risco de vida diariamente. Virtudes que findam gerando efeitos colaterais. Soldados que são arrogantes, desprezam e ignoram a visão do cidadão médio e se consideram investidos de uma missão especial e não dosam os meios com proporção aos fins. E em um processo de gradativa desumanização, são tragados pela violência em que vivem.
Com toda a sua dimensão, a obra-prima é capaz de arrebatar elogios dos fãs de Chuck Norris. Um caso raro de filme recheado de adrenalina e crítica: o primor de edição de som que nos coloca no meio do tiroteio, a câmera nervosa que fica salpicada de sangue e nos transforma em testemunhas oculares da guerra. O enredo flui consistentemente e a tensão só vai tomando contornos ainda maiores.
Ao longo da trama, favelados, policiais, bandidos e classe média são colhidas como vítimas da morte, uma obsessão para o BOPE. Motivo pelo qual o emblema do grupo é uma faca transpassando o rosto de uma caveira.
E com um rito de passagem terminamos o filme. O guerreiro bem vivido passa a arma ao competente aspirante para o batismo de sangue. Bem significativo a obra terminar com uma escopetada bem na cara do telespectador.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário