Sin Noticias de Dios, uma produção espanhola imperdível!
Trata-se de um filme alternativo e com produção barata dirigido pelo excelente roteirista e aqui também diretor Agustín Diaz Yanes. Sem Notícias de Deus nos apresenta diversos aspectos positivos e alguns, bem menos, negativos. Como já se sabe, não enfoco a minha crítica em pontos negativos, mas só nas qualidades da obra. Assim, passamos à análise qualitativa do trabalho.
Antes de mais nada, o ponto alto do filme é o brilhante roteiro multilingüal e cheio de mensagens interlineares que consegue envolver os espectadores nesta trama nem um pouco comum nos cinemas, com pitadas de política, religião e sarcasmo. A estória conta o conflito existente entre o céu e o inferno no que diz respeito às almas humanas. Manny é um boxeador que após sofrer uma contusão no cérebro tem que abandonar sua carreira. A partir daí, são enviados agentes, tanto do céu quanto do inferno, para conviverem diariamente com o boxeador e influenciá-lo a cair para um dos lados. A verdade é que o céu está em declínio e o inferno superlotado, o que pode contrastar uma realidade do nosso cotidiano, em que cada vez mais se trapaceia para conseguir o que se quer.
Nesta troca de críticas precisas com a situação atual do mundo, o céu é representado pela França, onde tudo é preto e branco e possui um clima recheado de classe, regado a muita música. Já o inferno se passa nos Estados Unidos, onde o calor e o sufoco sempre está presente, havendo referências indiretas ao MacDonald’s e à burocracia excessiva.
Porém, o ápice da trama se revela na terra mesmo, mais precisamente na cena da janta, em que os gerentes do céu e do inferno se reúnem para tratar da questão do desequilíbrio entre os dois mundos. Esta cena se mostrou, para mim, como digna de qualquer grande clássico do cinema norte-americano. Gael Garcia Bernal vive o administrador do inferno, em mais um papel brilhante, que prestes a ser derrubado do cargo resolve se unir ao céu e evitar, além da perda de seu posto, a volta do equilíbrio natural das almas. Mais uma vez aqui há comparações indiretas com a sociedade atual. Davenport, personagem de Bernal, discursa sobre a necessidade de que cada humano possa decidir o seu destino, um contraponto, a meu ver, com a democracia pouco existente nos dias de hoje. Além disse, insurge-se ainda com a supremacia dos poderosos no reino do inferno.
A direção é realizada com certa personalidade, contudo, conforme um camarada meu sempre diz, falta aos diretores estrangeiros, em sua grande maioria, captar toda a emoção e sentimento das cenas mais marcantes e decisivas de um roteiro. Consegue, ainda, contrastar muito bem as cenas do céu, falado em Francês, do inferno, dialogado em inglês, e da Terra, em que a língua utilizada é a da produção, ou seja, o espanhol.
Destaco a atuação das duas personagens principais. Victoria Abril é o anjo do céu, enviada para salvar a alma do boxeador, sendo que ela, cantora lá na boa vida, retorna à terra como a ex-esposa de Manny. Atuação brilhante, com personalidade muita constância durante todo o filme. A outra protagonista é nada mais nada menos do que a belíssima Penélope Cruz, que interpreta uma garçonete durona vivida no inferno, e que sobe à terra para viver uma prima e afilhada de Manny. As cenas mais brilhantes do filme incluem suas participações, que, com um jeitão nada feminino, traz ao filme um pouco de descontração.
É verdade que a película perde um pouco do ritmo no final, mas isso não desqualifica o trabalho surpreendente que este filme consegue resultar. Ressalto, ainda, a música Kung Fu Fighting, de Carl Douglas, na hora em que Penélope Cruz dança em seu quarto.
Esta obra alternativa consegue, portanto, superar as expectativas. Pelo menos a minha foi superada e, muito mais que isso, me demonstrou muita qualidade do pouquíssimo assistido cinema espanhol.
Acredite se quiser, mas estamos mais perto do inferno do que do céu nos dias de hoje!
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