É um filme confuso, sim. O excesso de trama que parece não se assentar nas simplórias duas horas que lhe cabem e a montagem um tanto desacertada não ajudam. É fácil de se perder nas conspirações e certas relações ficam obscuras.
Mas é um filme espetacular.
Na mão de Alfredson (que já havia entregado o espetacular Deixe Ela Entrar, um dos meus favoritos da última década) aquilo que teria potencial para ser mais thriller político interessante, porém passável, se torna um imenso quebra-cabeça climático, um filme absolutamente mais inteligente que a média. Não há toa, peças de xadrez cumprem um papel central aqui.
A trama parte da descoberta da existência de um homem-duplo na cúpula do serviço secreto inglês para nos apresentar o protagonista, George Smiley. Smiley é um inglês frio e fleumático, que usa seus imensos óculos (até mesmo na hora de nadar) como um anteparo ao mundo. Sua feição é sempre a mesma e durante o filme seu tom de voz se altera uma única vez. Smiley é aparentemente o melhor espião do país, e é designado para descobrir quem, entre os quatro cabeças da agência, é o infiltrado. Quem o vive é Gary Oldman, um dos grandes de sua geração, mas que sempre foi relegado a papéis menores e um tanto esteriopados (tente contar quantas vezes você já o viu como o vilão-excêntrico-com-arroubos-insanos). Para alguém que sempre esteve sob pele furiosas, viver o monolítico Smiley é uma espécie de tour de force as avessas. Sua atuação é modelar – tem destaque a cena que ele descreve seu encontro com o chefão da KGB, quase vinte anos antes –, e resto do elenco não fica atrás, sendo ele uma espécie de seleção inglesa.
A direção está nas mãos de um sueco, mas tem um nível de excelência semelhante ao das atuações. Alfredson filma tudo com um distanciamento cínico e clínico. Entrega novamente um filme frio, tanto em clima quanto em abordagem. Auxiliado pela fotografia, mergulha as cenas em escuridão e tons pesados, dá uma aula de construção de clima. É interessante ver também como ele é exímio em inserir pequenas “costelas” na espinha dorsal da trama, fatos e sub-tramas que à história principal não são essenciais, mas aprofundam muito a dimensão do filme. Em Deixe Ela Entrar haviam as questões acerca da sexualidade do pai do garoto, do gênero da pequena vampira, o parentesco (ou não) de seu tutor. Aqui há o relacionamento de Smiley com a esposa (apesar disso se revelar intrínseco à narrativa principal), a homossexualidade silenciosa de Guillam, a paixão do espião Tarr pela espionada.
O filme se beneficiaria muito se houvesse ali mais uma meia-hora, ou uma montagem mais criteriosa, mas difícil de compreender e apreender ou não, é uma das melhores coisas que 2012 trouxe até agora. Não estará, injustamente, nas premiações, e talvez até nem se fale muito dele, mas merece muitas e muitas palmas por ser a obra que é e por rejeitar o didatismo e facilidade do status quo cinematográfico.
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