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Highlander II - A Ressurreição

(Highlander II: The Quickening, 1991)
4,5
Média
52 votos
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Sua nota

Críticas

Cineplayers

Delírio incoerente dos imortais - alienígenas ou não.

6,0

Highlander II - A Ressurreição (Highlander II: The Quickening, 1991). Fonte: Divulgação Columbia TriStar Home Video
Highlander II - A Ressurreição
. Fonte: Columbia TriStar Home Video
O imortal Highlander Connor MacLeod

Uma recapitulação curta do primeiro filme é necessária por conta de termos a necessidade de um mínimo de sobriedade? Highlander - O Guerreiro Imortal (Highlander, 1986) parte de um pressuposto interessante ao tratar sua narrativa em duas épocas distintas – fins da idade média/começo da moderna nas highlands escocesas e o ano de 1986 nos EUA com tudo que a cultura dos anos 80 vulta a oferecer – e que versa sobre uma mitologia específica de sujeitos imortais que lutam entre si por intermédio de um tradicionalismo desta citada mitologia. O papo de só pode haver um e a porra toda. Para uma análise mais recauchutada deixo de brinde uma crítica minha aqui, desse primeiro filme da saga Highlander. Recapitulação findada.

Guardaram bem o parágrafo acima? Foda-se. Se preparem. Highlander II - A Ressurreição (Highlander II: The Quickening, 1991) joga quase tudo pra cima e mistura o material todo com ideias imbecilmente díspares. É um sci-fi cybenpunk onde os imortais agora são alienígenas do planeta Zeist (ou seres antigos pré-civilizações ocidentais e orientais; você escolhe qual a depender da versão do filme – são três e este direcionamento de origem é modificado numa, assim você designa quais são os problemas narrativos para lidar com cada uma delas), e que mandam dois não-morredores de castigo para um futuro onde a tecnologia é bem menor na idade média (sim, futuro). {{{ A versão que assisti é a que é mais aceita. Versão do diretor, alcunhada de Renegade, a que retira a origem alienígena entre outras diferenças. Ela tem 109 minutos, enquanto as outras mal passam de 90. }}} Saca aí a conversa. Voltando. Nalgumas versões (repetindo pra ficar bem clara a lombra) são alienígenas (que seu mundo de origem – alien ou não – é mostrado nuns 3/4 planos muito legais) enviados à Terra num tempo póstero distante que corresponde há pelo menos uns 400 anos antes de 1986. Noutra variante (Renegade) os sujeitos são uma espécie de humanoides (a priori humanos) que vivem no planeta Terra com alta tecnologia e enviam seus castigados a uma futuridade, na qual esta tecnologia não mais existe, afinal os caras devem ter se explodido sem deixar rastros no meio do caminho. Independentemente da alternativa um deles fica vivo até os eventos do primeiro filme – obviamente nosso herói anti-morte Connor MacLeod (Christopher Lambert). Eterno? Em duas versões (a de cinema norte-americano e VHS da época; e uma versão britânica) os alienígenas envelhecem normalmente até virem a ficar imorríveis na Terra, e na versão Renegade os caras ficam imortais ao irem pro futuro – o que entra em contradição com o primeiro filme já que os sujeitos viram perpétuos após terem mortes violentas e já terem uma predisposição para serem da estirpe dos perenes. Por isso há idades diferentes no momento do ganho da condição de imortalidade de cada um. Pra que eu estou buscando coerência? Não estou. Estou frescando. Oficializou o sujeito não papocar como punição? Ao virar mortal, o Highlander ajuda na criação um escudo tecnológico pra proteger a terra dos raios ultravioletas que destruíram a camada de ozônio (ele não é cientista, mas foda-se, viveu muito e experiência é o que conta, já que os poderes adquiridos  ao matar cada imortal não são lá bem explicitados – ler as mentes é citado?). Puta coincidência ele ser o sujeito que ajudou a salvar a humanidade desse problema climático. Que era uma questão amplamente debatida nos ditames da consciência ambiental à época de feitura da fita, e mais um dos medos de fodermos a atmosfera. Nisso vem o Ramirez do Sean Connery que morreu no filme 1 (sim, ele volta), só porque MacLeod chama ele no grito (“se você me chamar eu chego junto [grifo meu]”, diz Ramirez no prólogo, e os caras partem para destruir o diabo desse escudo já que a atmosfera normalizou. Afinal bastam 30 anos pra camada de ozônio, antes destruída, voltar à normalidade. Ah, e tem vilão Katana (Michael Ironside altamente pirado entendendo a energia do negócio) que vai pro futuro duelar com MacLeod, que era mortal e fica infinito ao matar outros 2 imortais estilosos no cyberpunkismo. Russell Mulcahy dirigindo esse material, filmado na Argentina com a inflação no talo. Russell tava muito doido? 

Highlander II - A Ressurreição (Highlander II: The Quickening, 1991). Fonte: Columbia TriStar Home Video
Highlander II - A Ressurreição. Fonte: Columbia TriStar Home Video
O tal planeta Zeist, ou uma Terra milhares de anos atrás, a depender da versão assistida.

Sentiram o drama?
Isto é Highlander II.
E citei só o resumão grosseiro e de verborrágica escrita pra vocês perceberem.
Eu me pergunto é que tipo de cachaça envelhecida em barril de madeira alienígena que esses caras beberam pra conceber uma parada dessas.
E quem aprovou estava alucinando que ia funcionar a parada.
E o primeiro não funcionou em termos de bilheteria (se garantiu no VHS).
Mas, sim em legado de culto com o tempo.
Então foda-se que qualquer coisa daria certo?
Essa droga que eles usaram eu queria experimentar.
Estão faltando filmes mais esquizo-aloprados como esse hoje.

Voltando ao filme. Diante de toda a putaria citada, há de se salientar que esta suposta demência cinematográfica diverte nalguns momentos. Vista hoje chega a ser um deleite ver um troço tão esquisito e fora do tom, que acaba por causar empatia exatamente pelo ideário quase inacreditável que a produção inventa de abordar. Em tempos de defesas acaloradas por sobriedades e disputas sérias do real ou qualquer coisa que o valha [ainda temos filmes mentirosos e exagerados sim, mesmo que colocados em segundo escalão em meios acadêmicos (aí dentro pra isso também), e mesmo esses não possuem o charme de loucura desse material – em sua maioria], é divertido ver uma tralha dessas ser altamente avacalhada e sem medo de ser feliz. Mais ainda por conta da débil consciência de que aquelas ideias gerariam lucro e crescimento aos envolvidos.

Highlander II - A Ressurreição (Highlander II: The Quickening, 1991). Fonte: Columbia TriStar Home Video
Highlander II - A Ressurreição. Fonte: Columbia TriStar Home Video
Um cyberpunk imortal maluco.

Porra, voltando ao filme. O clima de semi apocalypse cyberpunk é interessantemente projetado, isso é verdade. Lúgubre, sujo, com bom uso de cores. Azul, rosa, vermelho. E ainda mais com o destaque de um céu com escudo protetor no qual seu visual é um magenta abusivo (na versão final do diretor – Renegade – fora substituída por um azul, apesar de haver ainda muito magenta e vermelho no file) e movimentado por lasers do tal escudo. É uma conjuntura de tantos elementos, que acabam por nos deixar adentrar naquele universo. E este processo de coisa alquebrada serve de reflexo para MacLeod, agora um idoso que cumprira missões de salvacionismo sim, mas está cansado física e mentalmente. Assim como a doidiça que o cerca. A melancolia é seu estilo. Seus arredores estão no mesmo espectro. Acaba por ter uma relação mais intrínseca entre protagonista e ambientação do que o primeiro filme – isto na esfera do presente diegético da narrativa principal. Mulcahy ainda sabia ali criar algumas sequências de atmosfera interessantes (amalucadas, mas intrigantes via curiosidade mórbida). Porém, o filme é recheado de set pieces que vão se encaixando muito mais grosseiramente do que assim era no primeiro filme. Algo que aqui foge do diâmetro da interjeição da insanidade do universo e atinge a falta de refino. Tudo é fácil e acanalhado demais. Não que verossimilhança interna seja um ponto forte na saga inteira, mas quando o avacalho não diverte como figuração sobre si próprio, acaba virando pastiche que atrapalha o ritmo. As cenas de ação existem para manter os espectadores ligados, mesmo que as motivações sejam estapafúrdias ou modorrentas. Agora a feitura delas em si, segue uma fuleiragem na condução maior do primeiro filme. Se são bem iluminadas com alguns planos altamente decentes (outros, realmente são de escolhas falhas, e mal arrumados na montagem, não conseguindo empolgar; e contam com movimentos lentos demais), ou então uma percepção clara de que aquela turma não luta porra nenhuma.

A diversão atrelada a esta obra acaba por existir num misto de curiosidade mórbida e fascínio pelo exacerbo. Porque coerência, continuidade e outros elementos tradicionais ao cinema, o material fresca demais sobre isso. O que pode ser ótimo sob uma perspectiva mais livre. Então o truque aqui é contemplar a bagaceira. Mas não que isso seja um simulacro de isenção completo para a existência da fita, afinal as ações não ocorrem de maneira dinâmica quanto poderiam e as lutas, como já explicitei acima, são meio esculhambadas em seu ajambramento. Porém, consegue manter a minha reflexão via o espanto do que é mostrado. Como deixaram esse projeto passar? Um orçamento de US$ 34 milhões pra financiar isso. Entender o zeitgeist de uma época é um serviço intrigante. A década de 80 tem um significado amplo de ressaca política e moral, perpassando com o fim da Guerra Fria, desmantelamento da URSS, queda do muro de Berlim, crescimento do neoliberalismo com a duplinha Reagan e Thatcher, entre outras ressacas. E a conjuntura política acabou por – obviamente intrincada com a economia (nunca se desvencilham) – causar um desmantelo cultural e intelectual de tal forma, que antes a rebeldia de décadas anteriores deu espaço ao pessimismo e a uma perspectiva existencial hedonista, e tudo isso desembocou no cinema. Com obras grosseiras, pessimistas, alopradas e com visões de um futuro indecente. E o nosso bagaceiro material em questão lida com isso como um caldo cultural estranho e divertido. Com violência, cores berrantes, exageros a rodo, onde a preocupação é mais chegar a uma conclusão com pedaços de ação pelo caminho e uma estrutura chamativa, e menos contar uma estória coerente e funcional dentro de uma plausibilidade interna que fosse. A irregularidade é a marca desse filme, e que, se não serve de completo, talvez, como um microcosmo supostamente ideal na ressaca da década anterior (já que estava localizada muito incipientemente nos anos 90, que também não deixou de ser maluca, inclusive meteu algumas camadas sociais dentro), mostra uma vertente mais descontrolada e sem noção da mesma. Quando funciona, é uma insanidade colossalmente gloriosa. Independentemente de que diabos isso signifique.

Highlander II - A Ressurreição (Highlander II: The Quickening, 1991). Fonte: Columbia TriStar Home Video
Highlander II - A Ressurreição. Fonte: Columbia TriStar Home Video
O futuro de Highlander II, com o escudo protetor da atmosfera.

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